Reportagem Festival Paredes de Coura 2011
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Há magia em Paredes de Coura. Há magia no parque de campismo (que só fica atrás do do Milhões de Festa), com a sua paisagem e o seu rio; há magia na vila, que fica não muito longe, perfeita para almoçar e relaxar um pouco (e tem piscina municipal e tudo); e há, claro, muita magia nos palcos, naquele que foi, de todos os festivais principais (Delta Tejo, Optimus Alive, Super Bock Super Rock, Sudoeste TMN e Milhões de Festa) o que teve, no geral, os melhores concertos, onde poucos desiludiram.
Após ter feito o percurso de festivais, haveria melhor forma de terminar que não esta? Paredes de Coura foi, pelo menos este ano, efectivamente o melhor festival. Organização exemplar (poucas filas, concertos com poucos ou nenhuns atrasos, etc), e dias com alinhamentos bem pensados e fortes. Acredito que possam ter havido roubos, contudo não vi ninguém a queixar-se, e até mesmo o último dia (onde costuma ser mais fácil entrar no campismo) teve segurança. Enchentes? Não houve.
Parece que cerca de mais de vinte mil visitaram diariamente o festival e o recinto aguentou com todos na perfeição. As filas para comer ou ir à casa-de-banho nunca eram exageradas e era sempre possível ver os concertos no palco principal (que se localiza ao fundo de uma colina, proporcionando tanto uma visão privilegiada como um som espectacular) ou de pé ou sentado, tal como era fácil chegar bem perto do palco em qualquer altura. Afinal de contas, em que outro festival é que poderia ter chegado à segunda fila quinze minutos antes do início de Pulp?
Foram dias de concertos, foram dias de férias, foram dias em que se vivem e se guardam memórias para os anos vindouros. Se um festival quer, efectivamente, ser bem-sucedido, Paredes é o modelo a seguir. Em termos de ambiente, é apenas comparável ao Milhões de Festa; em termos de concertos e da forma como estes podem ser vistos (e das condições com que isso acontece), mais ninguém chega lá perto. Organização exemplar, num festival que foi, afinal de contas, uma verdadeira experiência.
Showcase da Lovers & Lollypops
Vale a pena falar do showcase da editora portuguesa que tem no seu catálogo nomes como, por exemplo, os grandes Black Bombaim, e que decorreu um dia antes do início propriamente dito do festival. Em palco (o secundáro) iriam estar os já mencionados Black Bombaim, e ainda os Larkin e Mr. Miyagi.
O público era já algum, algo que se esperava tendo em conta que já há mais de uma semana que era possível ir para o parque de campismo, e parte dele obviamente conhecedor do que aí vinha. É bom ver este pequeno culto a pequenas bandas nacionais, que merecem uma maior divulgação e iniciativas destas, que lhes permitem chegar a mais público. Tendo em conta que muitos estavam já a acampar há vários dias (efectivamente, quem chegasse neste dia não arranjaria lugar facilmente), fazer este pré-aquecimento foi uma belíssima ideia.
E se é verdade que nem os Larkin nem os Mr. Miyagi impressionaram particularmente, já os Black Bombaim deram um concerto notável do início ao fim, impressionante pela energia daquele stoner tão rock que estica as canções até ao infinito, transformando-as em ondas de som que vão envolvendo e, eventualmente, rebentando. Guitarra, baixo e bateria em comunhão perfeita (e que potente que vai ficando a bateria, ao longo de cada canção), e um concerto que envergonha muitos cabeças-de-cartaz que passaram por outros festivais. Nunca abriram a boca (é música instrumental, afinal de contas), e nunca precisaram de o fazer: o baixo e a guitarra diziam mais que o necessário. Agora é rezar para que cresçam e conquistem o mundo.
Os Larkin praticam um rock curioso, bem pensado, feito e, ao vivo, tocado, mas pecam, acima de tudo, por um factor que acaba por minar, em muito, os concertos do grupo: a voz do vocalista. É verdade que canta com atitude, e é de louvar a entrega e a forma como demonstra tão honestamente o quanto está a gostar de estar em palco, mas ao ouvi-lo a falar e depois a cantar fica-se com a impressão de que tenta manipular a voz para ser algo que não é. E, da forma que o faz, acaba por soar genérico e por vezes irritante. Custa dizer isto sobre uma banda jovem, ainda em crescimento, e na qual há, sem sombra de dúvida, talento em todos os membros (e custa dizer mal da voz de um vocalista que faz tudo desde atirar-se ao público a trepar colunas); mas é exactamente por essa mesma razão que se torna necessário reportar sobre esta falha. Afinal de contas, há ali muito potencial inexplorado e para tal é necessário que o vocalista tente, apenas, de mudar de registo. Resta esperar agora isso; que melhorem o que não é mau, mas que pode ser muito, muito melhor. Quem não ouviu o disco, que oiça.
Nos Mr. Miyagi, atitude é algo que não falta - mais um vocalista que se atira, e bem, ao público, e que até o insulta quando lhe roubam a fita que leva à cabeça - faria o mesmo. Mas tudo o resto soa a algo que já ouvimos milhares de vezes antes, e muito mais conexo e bem feito. Musicalmente, as músicas soam caóticas, sem propósito, mero barulho. Viu-se crowdsurfing, muitos saltos por parte do público, e muitos sorrisos; para muitos, foi uma festa. Para mim, nada mais foi que uma desilusão. Dão ocasionalmente vontade de bater o pé, mas não muito mais.
17 de Agosto – Recepção ao Campista:
Dia de Quarteto de Bolso, Omar Souleyman, Wild Beasts e, claro, Crystal Castles, os mais esperados da noite. O espaço do palco secundário era pouco para tanta gente, e era já uma grande multidão a que esperava os concertos ainda antes de Omar entrar em palco. Seria a primeira e última vez que haveria neste aspecto; o resto do recinto não estava ainda aberto nesta altura, por isso o espaço para circular era menor.
Omar Souleyman foi… bem, foi o Omar Souleyman. Um músico da Síria, com turbante e óculos escuros, que não fala inglês (teve alguém em palco a apresentá-lo no início do concerto e alguém a despedir-se por ele no fim), canta numa língua que ninguém percebe, mas que é uma figura tão caricata que acaba por ser tudo francamente divertido. A música, essa, é também bastante divertida, pop made in Síria, com ritmos energéticos que, ainda assim, acabam por se tornar repetitivos em alturas (o entusiasmo do concerto diminuiu a meio do concerto). Muitos saltos, muita festa, e o senhor Omar a interagir gritando “PORTUGAAAAALLL!”, batendo palmas de forma mecânica, e erguendo os braços no ar e mexendo as mãos como quem diz “Come on, show me what you’ve got”. Claro que não diz, porque só diz mesmo “PORTUGAAAAL!” e não sabe inglês, mas… Caricato, divertido e por vezes francamente cómico. Foi, portanto, uma bela festa.
Os Wild Beasts lançaram este ano o excelente Smother, e foi com esse pretexto que regressaram, mais uma vez, ao nosso país. O som podia ter estado melhor, mas isso em nada impediu o grupo de dar um concerto mais que sólido do início ao fim, com um alinhamento bem pensado e uma energia que contagiou do início ao fim. Além disso, havia genuidade nas palavras simpáticas que iam lançando ao público, dizendo que não esperavam ter tanta gente à sua espera. Hayden Thorpe tem uma voz excelente, profunda e com um timbre bastante único, e é bom ver que ao vivo impressiona tanto quanto em disco. O momento alto? Provavelmente "Hooting & Howling", o single que os lançou. Já está na altura de alguém os trazer cá a solo.
De seguida, vieram a dupla (que em palco é trio, com baterista), que todos queriam: os Crystal Castles. Presença assídua já no nosso país, e com um culto cada vez maior. Culto esse que muitos partilham, e tantos outros desprezam, compreensivelmente; afinal de contas, é música bastante única esta que nos trazem, electrónica diferente da maior parte do que se ouve por aí. Mas, em palco, torna-se inegável que, quer se goste quer não, há ali qualquer coisa de especial. Este concerto não se comparou ao espectacular dado no Coliseu, mas deu ainda assim para ver bem o talento da dupla. Alice Glass (que nome irónico, tendo em conta a energia e agressividade que demonstra em palco) não se atirou tanto ao público como seria de esperar, nem fez crowdsurfing, mas saltou e gritou como poucos fazem, e foi, mais uma vez, um concerto onde os moches e afins apareceram naturalmente. Tudo isso aliado a um bom jogo de luz e um parceiro que sabe bem o que faz (veja-se "Crimewave", que ao vivo é manuseada na perfeição nos teclados e afins, ganhando uma potência que não tem em disco), e tem-se um belo concerto, onde ficar quieto foi complicado.
Afinal de contas, tocar "Baptism" logo perto do início é mesmo pedir “Saltem como se não houvesse amanhã”, e terminar com "Yes No", já em encore (pouco mais de uma hora de concerto) é saber bem o que se faz. Já os vimos em melhor forma, mas Crystal Castles é Crystal Castles. São únicos em disco, únicos ao vivo, e quer se goste quer não, é impossível negar que há, de facto, ali qualquer coisa de especial.
18 de Agosto:
E aqui começou o festival a sério, com concertos nos dois palcos, o recinto todo aberto, e os grandes cabeças-de-cartaz que trouxeram tanta gente ao Norte (horas e horas de viagem a partir de Lisboa, Deus nos ajude). A grande atracção do dia eram, claro, os regressados Pulp, mas até lá seriam muitos os bons nomes que passariam pelos três palcos; afinal de contas, é preciso não esquecer o palco JN.
E é mesmo aí que começa o dia, com os The Kanguru Project. Rock agradável de uma banda a começar, num palco com esse mesmo propósito: mostrar ao público bandas novas. E os Kanguru Project são novos, ainda não sairam bem da bolsa, mas já conseguem saltar, e bem alto. Os membros tocam bem (boa coordenação entre todos, notando-se apenas algum nervosismo… normal, claro), e nunca caem no cliché nem se agarram a referências óbvias (rock normal e puro, sim, mas que não copia). Um concerto agradável de um projecto a acompanhar.
As coisas começaram mais a sério com os Crystal Stilts, no palco principal, e começaram bem. Toques de lo-fi num rock onde o baixo, acima de tudo, se assume como rei e senhor, e já algum público para os ver. Não há-de ter ficado na memória de ninguém, mas canções como "Departure", por exemplo, resultam muito bem ao vivo, tornando impossível não bater o pé. Lembram por vezes uns Crocodiles, que passaram este ano por cá no Alive, e o saldo no final do concerto é francamento positivo. Um agradável fim-de-tarde.
Twin Shadow, uma das revelações deste ano, veio a seguir, naquele que foi o seu terceiro concerto no nosso país (passou em Maio por Lisboa e Vila do Conde), e deu um concerto que, ainda que longe de ter sido um dos melhores do festival, confirmou tudo o que de bem se tem dito sobre o seu primeiro disco, "Forget". Ao vivo, ouve-se mais guitarradas que sintetizadores, e isso acaba por ajudar as canções a crescerem e a ganharam um impacto diferente. Veja-se "Slow" ou "Forget", que ganham fortes contornos rock ao vivo, muito mais potentes que em disco. Um belíssimo concerto, catchy do início ao fim (tal como o disco), e que confirmou George Lewis Jr. Como uma das revelações do ano. Em Setembro, regressa a Lisboa, tocando no Clube Ferroviário. Será mais um belo concerto, sem dúvida.
As Warpaint são, também, uma das revelações do ano, e foram e belíssima dose de rock suave e experimental do dia. Naquele que foi, muito possivelmente, um dos melhores concertos do festival, o quarteto feminino mostrou uma impressionante excelência musical em palco, tocando com uma mestria surpreendente as canções do magnífico "Exquisite Corpse". Algumas canções são alongadas, outras tornam-se mais complexas, e vê-se em palco um cuidado, um empenho e, também, um prazer enorme naquilo que fazem.
Veja-se aquela guitarra em "Elephants", que ao vivo ganha um poder inesperado, e aquela voz daquela vocalista (Emily, a principal), que em palco canta com uma fragilidade que tem tanto de vidro quanto de ouro. Consistente do início ao fim, e francamente impressionante tendo em conta a curta carreira da banda. Um dos melhores do festival, muito provavelmente.
O mesmo, infelizmente, não se pode dizer sobre o concerto dos Blonde Redhead. Frio e austero, a banda tocou na perfeição um alinhamento que não foi nada mau ("The Dress", "Falling Man"…), mas faltou, não querendo soar a cliché, alma ao que se ouvia. As músicas, mesmo lindíssimas em disco, não tardaram a tornar-se monótonas, e nem a dança deslizante de Kazu Makino e a sua voz de cristal (era, aliás, a única do trio que parecia estar a gostar realmente de ali estar) conseguiram salvar o concerto de uma austeridade que se instalou do início ao fim.
Teve momentos aborrecidos, teve momentos magníficos (sim, 23 é mesmo uma canção espantosa), e no geral fica uma mescla de canções e momentos inconsistentes. O público, frio do início ao fim, pareceu não estar particularmente para ali virado ao longo da actuação. Talvez a solo resulte melhor.
Tudo voltou a seu melhor nível com os grandes nomes do dia, e talvez de todo o festival: os Pulp. Parados desde 2002, o grupo de Jarvis Cocker regressou este ano para uma digressão que, graças a Deus, os trouxe ao melhor festival que temos. O resultado foi o que se esperava: um concerto magnífico, ora apoteótico ora francamente divertido, sempre liderado por um vocalista brincalhão e comunicativo.
Um concerto fenomenal, começado com um pano sobre o palco e um pequeno jogo de luz onde eram projectadas frases que iam suscitando a atenção do público até ao começo do espectáculo (que começou com algum atraso), onde nem um golfinho (“Would you like to see a dolphin? Well… would you?”) faltou, e num palco bem enfeitado com o nome da banda escrito em gigantes letras de neon e algum jogo de lasers; é simples, mas eficaz. Mas o verdadeiro espectáculo foi, claro, Jarvis Cocker, que logo de início (com a grande "Do You Remember the First Time?") mostrou bem estar ali para interagir, divertir e agradar. Poucos parecem gostar tanto do que fazem, e poucos conseguem ter tanto carisma e tanta presença em palco. Até falou com Piruças, o cão amarelo insuflável de Paredes que já lá anda desde 2008. “É melhor pedires a alguém para agarrar o cão por ti, ainda ficas cansado!”.
Um alinhamento em modo best of ("This is Hardcore", "Mis-hapes", os êxitos estiveram quase todos lá), uma banda a tocar na perfeição e um público que estava ali para a festa (foi, talvez, a maior enchente que aquele palco viu) foram os restantes ingredientes, além de Jarvis, que ajudaram a tornar este regresso dos Pulp num sucesso absoluto. Fossem todas as reuniões assim, e seriam muito mais bem-vistas. O final, com a inevitável "Common People", foi um dos momentos do festival e, provavelmente, um dos finais mais apoteóticos que muitos viram até hoje num concerto. Memorável.
19 de Agosto:
Foi, talvez, o dia mais forte do festival, em que todos os concertos foram espectaculares ou lá perto (bem… quase todos, pelo menos). O dia volta a começar, mais uma vez, no palco JN, com Erro. Não foi mau ao ponto de se querer fazer piadas com o nome, mas também não convenceu particularmente. Instrumentalmente tudo parece estar no sítio certo, mas o vocalista e as suas letras aleatórias e que acabam por cair frequentemente (leia-se, em 90% das vezes que abre a boca) no cómico acabam por "minar" tudo. Teve os seus momentos interessantes, mas no geral…
Por outro lado, os Meu e Teu demonstram em palco um à vontade e tocam um rock bem feitinho que conquistou facilmente os (poucos) presentes. Um vocalista que pede palmas, saltos e afins, um rock agradável e catchy (e com arranjos francamente bem pensados), e um concerto que foi dos melhores que passou por aquele palco (senão mesmo o melhor). São novos, ainda são recentes, e nota-se em palco a testosterona toda de ainda estar a dar os primeiros concertos; com tempo tudo há-de ficar mais arranjado e mais bem tocado. Por agora, no entanto, são já uma boa promessa.
De seguida, o primeiro grande concerto do dia veio logo com os You Can’t Win, Charlie Brown no palco secundário. A mega-banda portuguesa, que tem sabe-se lá quantos membros em palco, está mais confiante e bem oleada que nunca. Vão trocando de instrumentos com rapidez e sem falhas, tocam em palco como se não quisessem estar a fazer outra coisa, e as canções, que já em disco são óptimas, ao vivo crescem imenso e resultam na perfeição. "Green Grass" é um exemplo claro disso, tal como a grande "I’ve Been Lost". Um excelente concerto que, não fossem os grandes que se seguiriam, teria sido facilmente dos melhores do dia. São, sem dúvida, um dos nomes mais entusiasmantes da música nacional da actualidade
Quando se chega ao outro palco, já os Joy Formidable começaram. Rock das entranhas, feito com três em palco mas parecem ser mais, dada a potência e energia do que se ouve. Canções como "Whirring" ou "The Greatest Light is the Greatest Shade" ao vivo perdem o seu toque lo-fi mas ganham um poder surpreendente, entregue sempre com honestidade e simpatia (disseram que estavam contentes por ali estar, e pareceram estar a dizer a verdade). Aquele final, quase apoteótico, com todos em volta da bateria, foi talvez um dos momentos de todo o festival, e terminou um belo concerto da melhor forma possível. Concerto a solo, requisita-se.
De seguida, um verdadeiro nome de culto, que certamente levou muita gente a comprar o passe: …And You Will Know Us By The Trail of Dead. Sim, já se sabia que iam tocar pouco tempo e que seriam logo os segundos (tinham de apanhar um avião, parece), mas isso em nada minou o entusiasmo dos presentes, ainda assim não tantos quanto seria de esperar. Seis músicas apenas, mas mais que suficiente para aqueles que terá sido, para muitos, um dos melhores do dia (e isso não é dizer pouco, tendo em conta o dia que foi).
À segunda canção, o quarteto jé está completamente aquecido, já se vivem momentos de uma intensidade a que muitos concertos nunca chegam, e tudo é já um triunfo absoluto (ainda que triste… afinal de contas, é realmente pena que não tenham tocado mais). Vão trocando de instrumentos entre si, da guitarra para a bateria, revelando uma mestria que torna tudo mais interessante, e canções como "Gargoyle Waiting" ou a fenomenal "Will You Smile Again?", no final, deram os momentos mais puros de rock que o festival viu. Curto (pouco mais de quarenta minutos, creio), mas muito, muito bom (e note-se que eu, pessoalmente, nem era fã). Resta agora esperar que regressem, num concerto com uma duração mais digna do que merecem (eles e nós, diga-se).
No entanto, a banda que viria a seguir conseguiria fazer ainda melhor. Num dia fortíssimo, o concerto do dia (e, de muito longe, um dos melhores de todo o festival) seria dos Battles, que se estrearam finalmente no nosso país. E, meu Deus, que estreia.
Apoteose do início ao fim, tudo muito bem construído, num jogo de camadas e sons que viria apenas a ser igualado por uma certa e incrível banda de post-rock que viria a actuar naquele palco no dia seguinte. Tocam com energia e, diga-se, carisma (que figura curiosa que é, o guitarrista e o seu bigode), e nenhuma das canções desilude ao vivo. Uma fusão de sons, desde dance music ao mais puro rock, que faz com que seja rigorosamente impossível estar parado no mesmo sítio. Muito do público estava lá por eles, e isso viu-se: devoção e respeito por parte de uma plateia conquistada logo aos primeiros minutos. E, sim, "Atlas" foi mesmo um dos momentos do festival (mas "Ice Cream", diga-se, também foi genial).
Ao início faz alguma comichão vê-los a usar samples e afins, mas tendo em conta que são apenas três, e que os samples são eles mesmos que os vão inserindo (mais uma vez, é preciso ter cabeça para saber encaixar aquilo tudo), tudo acaba por pintar um quadro onde estão retratados três grandes, grandes músicos. No final, o baixista agradeceu e disse que estava ansioso por nos voltar a ver “muito, muito em breve”. Concerto a solo marcado? Esperamos que nós. Por agora, no entanto, uma coisa podemos dizer: os Battles partiram tudo quando actuaram pela primeira vez no nosso país, e nós estivemos lá para ver na primeira fila.
Os Deerhunter, ao vivo, impressionam. "Halcyon Digest" é, sem sombra de dúvida, francamente bom, mas encontra-se longe da genialidade de um "Microcastle", por exemplo. No entanto, ao vivo tudo faz mais sentido, e tanto as novas como as antigas ganham um poder à base de guitarra que espanta quem, como eu, nunca os tinha visto ao vivo. Bastou logo o início, com a bela "Wash Off", para surpreender pela positiva; e o mote seria, exactamente, esse.
Tudo tocado com impacto e poder, e sempre com um Bradford Cox simpático e comunicativo (diz que adora tocar em Portugal (mais um que se enganou e pensava estar no Porto…) porque somos um país muito assombrado… "yap", faz sentido), e uma banda em perfeira harmonia. Sofreram do mesmo problema que os Trail of Dead: concerto demasiado curto, com apenas oito canções. Mas mais que suficiente para darem aquele que foi, sem dúvida, um grande concerto. No final, um pequeno golpe de génio, quando terminam com aquela que é, diga-se, a sua melhor música, e talvez mesmo uma das canções da década: "Nothing Ever Happened", esticada, alongada, apoteótica e de ir às lágrimas. Genial.
Já diziam os Monty Python: "...and now, for something completely different". E foi isso mesmo. Os Kings of Convenience, dois tipos com guitarras acústicas, chegaram ao palco e foi impossível não sentir, de imediato, uma diferença depois de toda a energia que se sentiu ao longo da tarde. Passámos, de repente, do rock para os Simon & Garfunkel. E foi bonito, sim; agradável, simpático. Nunca chegou a mais que isso, já que esta não era, afinal, a "praia" deles.
O público ouviu, sempre calado e respeitoso, e isso é de louvar, mas só na zona mais perto do palco se viam realmente demonstrações de devoção em canções como "Rule My World" ou, claro, a inevitável "I’d Rather Dance With You". Eventualmente trazem mais dois músicos ao palco, mas isso não ajuda muito; continua tudo muito calmo, bonito, sim, mas por vezes monótono.
Mas sou suspeito: gosto muito de Simon & Garfunkel, e os Kings of Convenience, infelizmente, transpiram Simon & Garfunkel por todos os lados. Nas guitarras, nas letras, em tudo. Em disco isso não se nota tanto, dados os arranjos que dão às canções, mas ao vivo…
Enfim, um concerto simpático e agradável, que proporcionou uma noite bonita, mas nada mais que isso. E, sejamos honestos, Erlend Øyé é provavelmente um dos músicos mais "cromos" que alguma vez passaram pelos nossos palcos.
As coisas não mudaram muito com Marina & The Diamonds. Concerto agradável, com uma pop energética cantada por uma vocalista que, provavelmente, passou toda a sua vida a ouvir Madonna e Blondie. Simpática, obviamente contente por ali estar, e com uma energia contagiante, Marina cantou canções como "Girls" ou "Shampain" para uma plateia reduzida que, infelizmente, não estava realmente ali para ela, e em que só os mais próximos do palco reagiram ao seu claro entusiasmo. Divertido, agradável e pop catchy cantada a boa voz.
20 de Agosto:
Mais um dia forte, e com aquele que viria a ser o melhor concerto do festival (leia-se: dos concertos que vi).
O dia começou com um nome conhecido de todos: Linda Martini. Já tinham passado por aquele mesmo palco em 2007, num concerto que muitos afirmam ter sido espectacular, e regressaram… para repetir a proeza. Foi a sexta vez que os vi, e uma das melhores (e muito, muito melhor que o concerto no Alive). Isso deve-se não só à banda e ao público, ambos ali de coração e alma, mas também ao excelente som do palco; raramente se ouviu a camada de guitarras de "Este Mar", logo a primeira, assim tão bem, por exemplo.
O quarteto tocava com carinho cada acorde, e o público recebia com esse mesmo carinho cada som. Moche carinhosa, crowdsurfing feito como se fosse entre familiares, e canções que já todos sabemos do início ao fim ("Amor Combate", a incrível "Dá-me a Tua Melhor Faca"… hinos de uma geração). Até Hélio se atirou ao público e fez crowdsurfing, já no fim do concerto. Grandes, como sempre. Tocam como ninguém, e fazem-no com um amor que só lhes fica bem. Por este andar, nunca nos havemos de fartar.
“Os que vierem a seguir estão lixados se não forem bons”, dizia-me um amigo meu no final. E tinha razão: depois de um concerto como o dos Linda Martini, era difícil igualar. E não foi isso que Maika Makovski, espanhola que canta num inglês perfeito, e a sua banda, repescados à última hora para substituir Foster the People após estes terem cancelado toda a sua digressão europeia, fez. Mas também esteve longe, bem longe, de envergonhar alguém.
Naquele que foi um bom concerto de rock com toques de blues, com uma Maika a lembrar por várias vezes uma PJ Harvey (mas, por outro lado, não lembram todas?), o dia continuou bastante bem, com um nível que se viria a manter ao longo de todo o dia e noite. Maika foi simpática, comunicativa, falando em espanhol e inglês, e foi pena que o público, na sua maioria sentado e a ignorar o que se passava em palco, nem lhe tenha dado grande hipótese. Tarefa ingrata, esta de substituir músicos. Mas cumpriu-a, e muito bem.
A seguir, o concerto mais assustador do festival. Os Two Door Cinema Club, a banda mais genérica que passou por todo o festival, chegou e divertiu com o seu pop-rock tão… bem, tão catchy e igual a tanto outro pop-rock que anda por aí. Mas foi assustador ver o público, aquela legião de milhares de fãs, a cantar tudo do início ao fim, a fazer moche (?!) e crowdsurfing (?!?!) numa banda que, simplesmente, não tem uma sonoridade para isso. Sim, cançõe como "I Can Talk ou Sleep Alone" dão vontade de saltar e mexer o corpo, mas… moche? Crowdsurfing? Assustador ver mais disso neste concerto que em Linda Martini ou Trail of Dead, por exemplo (agora que penso bem, é mesmo assustador). Enfim, é o que faz uma faixa etária na sua maioria abaixo dos 18, com as hormonas aos saltos. Ver tudo aquilo acabou por tornar o concerto francamente estranho em vários momentos, e não é de espantar que, com a recepção excitada que tiveram, não foi de estranhar quando o vocalista disse, no final, que “Isto foi completamente ridículo”, dizia-o no bom sentido, claro, mas dá vontade de o dizer também no mau, ou pelo menos no estranho. O concerto propriamente dito foi giro, divertido, energético e inconsequente. Se alguém se lembrará deles daqui a um ano? Provavelmente não, mas, ao vivo, conseguem entreter. Mas… meu Deus… moche naquilo? Que coisa bizarra.
Foi mais um bom concerto, no meio de tantos outros bons ou grandiosos. Por esta altura, era altura de fazer balanços, e era difícil escolher apenas um grande concerto, um que se comseguisse destacar de entre todos, dado equilíbrio do que se viu até àquela altura. Escolher um concerto como o melhor afirmava-se impossível. Até terem chegado os Mogwai.
Podemos dizer que, dentro do post-rock, há dois grandes deuses: os Mogwai e os Godspeed You! Black Emperor. Podemos dizer mais nomes, claro, desde uns Mono a uns inevitáveis Explosions in the Sky ou uns God is na Astronaut, mas a verdade é que foi destes dois que tudo surgiu; sem um "Young Team" e sem um "Lift Your Skinny Fists Like Antennas to Heaven", o género simplesmente não seria o que é hoje.
O que os Mogwai, que pisaram aquele palco em 1999, dizendo Stuart Braithwaite que desta vez “Foi muito mais divertido" mostraram neste concerto, tal como já tinham feito na Aula Magna, o que se esperava: poder. Puro poder em todos os aspectos: sonoro, emocional, musical, tudo isso e mais. Em cerca de uma hora e quinze minutos, os escoceses defenderam com perfeição absoluta um legado que se apresenta tanto passado como presente e futuro. "Hardcore Will Never Die But You Will" está bem longe de um "Rock Action" ou de um "Young Team", mas a verdade é que ao vivo tudo isso desaparece. Canções como "White Noise" (um início de ir às lágrimas, literalmente), "San Pedro" ou "Mexican Grand Prix" ganham um poder, uma potência que as elevam ao estatuto em que estão os grandes clássicos do grupo.
Em disco, podem soar a canções óptimas, mas abaixo das grandes de antigamente; ao vivo, estão bem lá em cima com os hinos do grupo. Um concerto transcendente, que se viveu na pele e na alma, de olhos por vezes abertos e por vezes molhados, por vezes secos e por vezes humedecidos (emocionalmente falando, o post-rock pode ser um género poderosíssimo; os Mogwai, tal como os Godspeed You! Black Emperor, demonstram bem isso). Um bom jogo de luz, uma tela que ia passando algumas imagens, e um quinteto em palco vestido como se estivesse em casa, que poucas vezes falou; afinal de contas, porque precisariam de o fazer? A música diz tudo o que há a dizer, sem palavras.
Num alinhamento que nem foi assim tão curto (onze músicas… e tendo em conta que não são músicas pequenas) e que teve pequenos golpes de génio (ahh, quem diria que iam tocar a "Two Rights, One Wrong?"), o grupo concentrou-se, como seria de esperar, no seu último disco, defendendo-o, e muito bem, em palco. "Rano Pano", "San Pedro"… momentos grandiosos, impressionantes. São, realmente, uma banda que ao vivo funciona de forma incrível, transpondo para o palco com uma mestria inigualável canções complexas que, ao vivo, não perdem essa complexidade mas atingem de forma mais directa que nunca. Nisso, o som ajudou: foi possível distinguir todos os pequenos pormenores, todas as pequenas mudanças de ritmo, todos os pequenos sons. Aquela muralha de guitarras como só eles fazem tanto emocionou como intimidou, e os efeitos criados no vocoder soaram perfeitos ("Hunted by a Freak", já perto do fim, foi arrepiante, como sempre).
E foram eles que nos trouxeram o grande momento de todo o festival: "Mogwai Fear Satan", aquela epifania de mais de dez minutos, que vai construindo aquela muralha de guitarras que emociona, agarra, depois nos rebenta na cara após acalmar (ingénuos, os que bateram palmas achando que a música estava a terminar, quando na realidade ainda faltava o clímax), e depois nos volta a emocionar. Absolutamente incrível. O final, com "Batcat" (ainda não foi desta que nos brindaram com a "Glasgow Mega-Snake") foi do mais épico possível, e houveram momentos em que parecia que, de facto, o mundo estava a acabar. Ruído, explosões de luz e fumo. O mundo não acabou, mas se tivesse acabado, teríamos todos certamente morrido com um sorriso no rosto. Concerto do festival, um dos concertos do ano, e eles continuam a ser o sempre foram: um dos maiores de sempre.
No palco principal, tudo terminou como começou: com uma reunião. Foram os Pulp no primeiro dia, e foram os Death From Above 1979 no último. E se os primeiros foram magníficos, dos segundos podemos dizer também o mesmo. Num alinhamento onde tocaram… bem, tudo, já que só têm um disco e um EP, a dupla mostrou ter em palco uma energia contagiante, que facilmente desabrochou em moche e crowdsurfing por toda a plateia. Punk como poucos fazem, puro e directo ao osso, onde um baixo e uma bateria bastam (e muito bem!) para criar o caos.
É impossível ficar parado, é impossível não ficar com um sorriso no rosto, e é ainda mais impossível não gostar. Testosterona pura, entregue por um simpático Sebastien Grainger (que até disse que ia lá abaixo à plateia violar quem fizesse mal às raparigas… simpático e com valores!) que toca bateria como se estivesse ligado a uma ficha eléctrica e canta da mesma forma e um Jesse F. Keeler (sintetizador, backing vocals e, acima de tudo, baixo) concentrado mas perfeito no que faz, a dupla não desiludiu os que ansiavam por ver, finalmente, os Death From Above 1979 ao vivo.
Grainger bem brincou com o facto de serem cabeças de cartaz, dizendi que era uma posição difícil de defender com apenas um disco e um EP… e é, realmente, curioso vê-los agora como cabeças-de-cartaz. Quem se lembra de quando passaram por este mesmo festival em 2005, no mesmo dia que os Foo Fighters (na mesma edição onde tocaram os Pixies, os Arcade Fire, os Queens of the Stone Age, os The National, os…), e foram recebidos com monotonia? Entretanto ganharam mais fãs, regressaram, e o resultado está à vista: uma plateia devota e conquistada. E ainda bem, que eles bem mereceram. Foi mais um grande concerto.
Foi o fim de um grande festival que foi, diga-se, o melhor do ano. Sim, o campismo não é tão bom quanto o do Milhões (bem, se eles cobrissem tudo de relva…), mas os concertos e, tal como já foi dito, a paisagem compensam tudo isso. Um rio ali ao pé para quem se quiser refrescar, um público que em todo o festival se portou bastante bem (sempre respeitoso, mesmo com nomes que obviamente não conhecia), um ambiente como só Paredes consegue… e concertos, muitos e grandes concertos, que vão ficar na memória dos presentes. Foi o local ideal, com o cartaz ideal, com as condições ideais.
Se um festival de Verão deve, de facto, ser uma experiência… então a experiência que deve ser é realmente esta. Sem falhas.
As memórias, essas, vão perdurar por anos e anos; as saudades, felizmente, só até ao próximo Verão.
Uma relação com Paredes de Coura é, afinal, uma daquelas que dura para a vida.
E no próximo ano lá estaremos todos, para mais umas quantas noites de núpcias.
Reportagem Sudoeste TMN 2011
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Realizou-se mais um Festival Sudoeste TMN 2011, a Herdade da Casa Branca encheu-se de festivaleiros para a 15ª Edição deste festival.
Com um cartaz virado, principalmente, para o reggae e hip-hop, com nomes em palcos secundários como dEUS, Zola Jesus ou Destroyer, que teve provavelmente menos de 50 pessoas a assistir ao concerto, grande parte do público não assiste aos concertos nos palcos secundários. O cartaz continha dois grandes nomes que chamaram muito público e deram grandes concertos: Kanye West e Snoop Dogg.
4 de Agosto
O festival contou com quatro palcos: o TMN, o Planeta Sudoeste, o Positive Vibes e o Groovebox.
Os Asian Dub Foundation, tocaram no Palco Positive Vibes para um público que parecia ser pouco conhecedor e que, de início, não reagiu de forma particularmente efusiva à música da banda - uma excelente mescla sonora onde há de tudo desde reggae ao hip-hop. Foi de louvar a forma como o grupo conquistou o público, puxando pelos presentes do início ao fim, tocando sempre com uma energia que acabou por contagiar os presentes. Claro que com canções como “Flyover” ou a apoteótica “Fortress Europe”, que fechou o concerto já em encore, é impossível ficar com os pés no chão, mas foi importante e impressionante a forma como a banda conseguiu transformar aquele que à partida poderia ter sido um concerto morno num dos melhores do festival, impressionante e festivo.
Curiosamente, neste dia tudo parecia virado para um único nome: Snoop Dogg. Até Janelle Monáe tocou para um público menor do que esperado, dando um concerto similar ao que já tinha dado no Super Bock em Stock: ou seja, fenomenal, e, desta vez, foi ainda mais interactiva. Canções como “Cold War” ou “Tightrope” ao vivo ganham uma potência inexplicável, e isto aliado a uma banda numerosa e festiva acaba por criar um verdadeiro espectáculo. E depois está claro, Monáe: dança, canta, e move-se como ninguém. Soul assim raramente se faz.
Os Destroyer, banda liderada por Dan Bejar que tocou no palco Planeta Sudoeste, foram um exemplo de um concerto que, simplesmente, não tinha público alvo no Sudoeste TMN. Chegaram com o excelente Kaputt na bagagem e trouxeram um concerto diferente de tudo o que se viu em todo o festival. Rock com influências claras de jazz e com um som complexo e cheio, entregue por uma banda de seis, que encheram a tenda para os poucos presentes. Uma autêntica viagem sonora e o mais alternativo que provavelmente se viu em todo o festival. No fim o balanço foi muito positivo, quem não viu nem sabe o que perdeu.
Raphael Saadiq tem boa voz e músicas simpáticas, com uma forte veia romântica e inspiração em hip-hop, jazz e soul, mas não tarda a cansar. A verdade é que as canções rapidamente começam a parecer demasiado parecidas e a sua voz, ainda que boa, não encanta por aí além. Claro que canções como “Good Man” ao vivo resultam bastante bem, mas nem todas são assim e os bons momentos não são suficientes para sustentar um concerto inteiro. Num outro ambiente, talvez tivesse resultado melhor. Ainda assim, foi já algum o público que o ouviu, com atenção e respeito.
Com algum atraso, entrou em palco o grande nome da noite: Snoop Dogg. Uma multidão de dezenas de milhares para o ver, uma entrada épica com música clássica e tudo para criar o tom certo e lá entra Snoop, de óculos escuros, com aquele estilo relaxado e cool que todos conhecem. Snoop Dogg é, hoje em dia, não tanto um músico mas antes uma personagem, uma caricatura do hip-hop que fala de ganza e gajas, com muito bling à mistura. Sim, ele teve bailarinas quase nuas em palco; sim, ele fumou durante o concerto; e, sim, foi muito divertido. Como não o poderia ser, com êxitos como “Sensual Seduction” ou, claro, “Drop It Like It’s Hot”? É curioso ver a forma como todo o público canta a uma só voz aqueles êxitos, mostrando bem que Snoop é, além daquela figura tão única, visto como um músico talentoso, com uma numerosa base de fãs.
Ele bem pareceu gostar do que viu: comunicou, pegou numa bandeira portuguesa e disse que este seria o primeiro mas não o último concerto seu por cá. Pela reacção do público, conquistado do início ao fim, é bem provável que tal venha a acontecer e ainda bem. Há que falar da homenagem que Dogg fez a Tupac, a meio do concerto, é bom ver que a comunidade hip-hop tem respeito e honra as suas origens e os seus maiores mestres. Snoop Dogg homenageou Tupac e Kanye West falou, no dia seguinte, em Michael Jackson - é de louvar.
A festa continuou pela noite dentro nos restantes palcos, com rave atrás de rave. Os Bag Raiders, duo que faz electro dançável, estavam ainda a actuar e foi bonito ver a tenda tão repleta de gente aos saltos de braços no ar, a viver uma autêntica festa. Ali, a noite não tinha fim.
5 de Agosto
O dia pertencia a um único nome e todos o sabiam: Kanye West. Horas antes, já alguns o aguardavam na grade em frente ao palco principal, esperando ver o mais perto possível o actual deus de um género.
Ainda assim, foram poucos os que assistiram ao bonito, ainda que por vezes inconsistente, concerto de Marcelo Camelo. Pop-rock agradável e de fácil audição, que nunca aborrece mas que a certa altura se torna repetitivo. Pouco mais de uma centena de espectadores o viram, e é pena: foi um belo início para um longo dia de concertos. Nunca impressionou por aí além, mas deixou facilmente um sorriso na face dos presentes.
Os Deolinda vieram a seguir e já tiveram uma boa multidão à sua espera, que sabia os maiores êxitos de ponta a ponta, que cantou em uníssono com uma Ana Bacalhau de saia atrevida e em modo quase sex symbol. Canções como “Fado Toninho” ou a tão falada “Que Parva Que Eu Sou” foram muito bem-recebidas por um público que sabia bem o que esperar. Concerto muito agradável, mas que mostrou a maior falha da banda: a sua falta de espontaneidade.
Como é possível que todas as interacções com o público soem tão mecâncias e planeadas, perante um grupo tipicamente português com uma vocalista que parece gostar tanto do que faz? Bacalhau e o resto da banda têm de se libertar mais e criar uma maior ligação com o público para que cantam. Afinal de contas, são uma banda de cá e estão a tocar para quem já os conhece há anos. Entre amigos, não é preciso tanta formalidade.
Foi uma espera algo longa até chegar Patrice, que entrou atrasado após os Deolinda terem acabado depois da hora. Quando chegou ao palco, recebeu a maior ovação que se tinha visto até agora, o público sabia bem o que esperar e muitos estavam lá para ele. Quer se goste ou não, é inegável que o músico sabe bem como jogar com os singles e com o público fazendo os joguinhos típicos do “Vamos dividir o público ao meio e ver quem grita mais” que, inevitavelmente, acabam por resultar.
O momento mais alto (de longe) foi, claro, o êxito “Soulstorm” e é impossível não ficar com a impressão de que toda a carreira do músico se move à volta dessa única canção. As restantes músicas resultaram, ainda assim, e entreteram bem um público sedento de festa. Há que falar do baixista da banda que acompanha o músico, o mais sorridente em palco, que foi talvez quem mais puxou e chamou pelo público. Diversão sem preconceitos nem presunções.
Foi uma espera ainda maior até Kanye West, o senhor da noite (e de todo o festival, diga-se), entrar em palco. Com quase uma hora de atraso e duas partidas em falso com as bailarinas em palco, todo forrado em branco, ouviram-se gritos de descontentamento por parte de um público que, ainda assim, nunca arredou pé. E quando o concerto começou, com as dezenas de bailarinas em palco, tudo, mas rigorosamente tudo, valeu a pena. Tal como ouvi alguém dizer ao meu lado, a noite estava ganha desde o início. Grande jogo de luzes, uma coreografia impressionante, tudo ao som do início de “H.A.M.”, o single do disco que junta Kanye West e Jay-Z, e sentiam-se arrepios na espinha naquele que era apenas o início do espectáculo. O pano cai e revela uma parede de fundo inspirada na tradição greco-romana, e ouve-se o início de “Dark Fantasy”, a faixa que abre o último disco do músico (My Beautiful Twisted Dark Fantasy, muito provavelmente um dos álbuns da década). O público enlouquece, Kanye West surge do nada numa plataforma que levita acima do público no corredor central que o separa, e rapidamente se torna um facto aquilo que todos esperavam: ia ser um concerto memorável.
O que se seguiu foi um concerto sem falhas, genial do início ao fim, criado e pensado por um artista em pleno uso das suas capacidades. Impressionante em todos os aspectos, desde as bailarinas ao jogo de luz, desde o fogo de artifício à chuva de faíscas, mas impressionante, acima de tudo, pelo homem por trás de tudo: Kanye West. Por mais fascinante que seja todo o jogo cénico, é à volta dele que tudo gira, e West é, em palco, genial. Gesticula, corre, rodopia, encarna a personalidade épica e sumptuosa das suas canções. Canta com calma, e cada verso é entregue com significado e poder. A energia que transmite é notável, e não precisa de interagir com o público: a música, e quem a canta, falam por si. Sem falhas, memorável, e frequentemente arrebatador.
Num alinhamento que percorreu todos os seus discos, e onde não faltaram êxitos como a espectacular “Stronger”, que teve direito a um belo jogo de fumo, “Good Life”, introduzida epicamente por um sample de PYT, de Michael Jackson, que culminou com West a saltar no ar começando o seu single numa autêntica e impressionante onda de energia, e a fenomenal “Touch the Sky”, com o público a saltar de mãos no ar em uníssono com o músico. Há que dar destaque a “Runaway”, que contou com a presença de Pusha T em palco, uma bela surpresa. Não falou muito, mas quando o fez foi sempre para puxar pelo público de forma honesta, não era planeado, e sempre que queria falar antes da próxima canção fazia sinal de paragem a um dos seus três músicos que estavam em sintetizadores. “Digo muita merda e dizem muita merda sobre mim”, diz a certa altura. “Nós defendemos essa merda”. Defendem, e muito bem.
Quando falou, foi honesto, mas nem precisava de o fazer: os sorrisos que ia mandando (logo ele, que nem sorri muito) eram o suficiente.
Sumptuoso, épico e grandioso, com momentos frequentemente lindíssimos, entregue por um homem que é tudo isto de forma genial, foi um concerto que dificilmente sairá da memória dos presentes. Facilmente um dos melhores do ano. Kanye West é, de facto, um dos melhores da sua geração e um dos maiores do nosso tempo. Uma epifania de duas horas, dividida em três actos. O concerto do festival estava dado.
Os Underworld vieram depois e tocaram para um público muito menor. Uma pequena festa, com um electro potente e um vocalista com presença e um bonito jogo visual.
Competentes, terminaram o dia da melhor forma possível: em festa.
6 de Agosto
Talvez o dia mais light, sem um grande cabeça-de-cartaz definido, Scissor Sisters e David Guetta eram os maiores nomes, mas que verificou maior enchente.
Foi, talvez, aquele em que se viram os concertos mais fracos. As coisas começaram logo mal com os Mexican Institude of Sound, electrónica sem pés nem cabeça com muito azeite à mistura, até tocaram um remix da Macarena. Eram poucos os que ali estavam para os ver, a maior parte estava sentada no chão sem prestar grande atenção, e isso precebe-se, francamente mau.
As coisas não melhoraram muito com Valete, que veio a seguir. O rapper português teve um público nomeroso e conhecedor à sua espera, que esteve conquistado do início ao fim, mas é difícil dizer bem de um rap assim, tão inconsequente e desinspirado. Letras controversas, uma banda que não impressiona e percebe-se o porquê do culto: Valete diz que o FMI é uma máfia organizada, que devíamos todos fazer uma revolução…. Politiquices atiradas ao ar, por quem percebe tanto de política quanto de música. Muitos convidados, muitas canções, todas elas bastante más, mas um público numeroso e conquistado.
O mérito dos The Script é inegável. Sabemos todos que eles não trazem nada de novo, que lembram, mesmo muito, os U2, e que são completamente inconsequentes e daqui a uns anos ninguém se lembra deles. Mas é difícil dizer mal de um grupo que está ali a gostar tanto do que faz, e a fazê-lo com tanta alma para os fãs. Sim, a música não é boa, mas a atitude acaba por ajudar e é difícil não ficar com um sorriso ao ver a simpatia da banda e a forma como se comportam em palco. “The Man Who Can’t be Moved” é um dos singles mais conhecidos da banda. Com boa postura, são honestos quando sorriem e dizem que gostam imenso de cá estar e nós acabamos por sorrir também.
Os Scissor Sisters conseguiram divertir bastante os festivaleiros contudo desiludiram pois não foi a festa apoteótica que se esperava. Por duas razões em particular: algum público esperava pelo senhor Guetta e não aderiram à festa dos Scissor Sisters e porque Jake Shears esteve energético mas algo morno e a sua voz desiludiu. Tudo é compensado por Ana Matronic, um animal de palco, que canta e puxa pelo público como ninguém. Foi bonito, muito bonito, vê-la sair do palco para ir cumprimentar um jovem chamado Ricardo que estava no palco a cantar todas as canções do início ao fim.
Notou-se que o público desligava em canções menos conhecidas e que só despertava em singles como “Comfortably Numb”, “Take Your Mama”, “Fire With Fire” ou, claro, a apoteótica “I Don’t Fell Like Dancin’”. Foi uma festa, sim, mas não a que podia ter sido. Talvez da próxima, a solo, com um público diferente, as coisas resultem ao nível do que podia ter sido.
David Guetta veio a seguir para animar os festivaleiros. Um espectáculo visual bem pensado mas que está a milhas, por exemplo, do que é dado pelos Chemical Brothers. Beats bem escolhidos fizeram a festa e era ver o público a dançar e cantar sem parar. Alguns dos momentos mais altos ocorreram com "One Love", “When Love Takes Over" e "Gettin' Over". O pico aconteceu com "Love Don't Let Me Go". Olhando em volta o público estava conquistado. Para o ano, a sua presença já esta confirmada.
7 de Agosto
E no último dia, mais uma vez sem um cabeça-de-cartaz particulamente impressionante, eram já muitos os que de manhã abandonavam já o parque de campismo. Afinal de contas, os The National estiveram cá em Maio, os Interpol em Novembro, e os Swedish House Mafia não têm a fama de um David Guetta.
Foi o dia em que se pôde espreitar mais o palco da Santa Casa e ainda bem. Os Polock, banda de indie-rock espanhola mas que canta em inglês (e muito bem), têm um som catchy e agradável. Mais uma vez, eram poucos os que os foram ver, mas quem ali esteve não se arrependeu nada. Boa voz, boas guitarras, boa música, têm o potencial de ir mais longe e com sorte voltarão cá a solo em breve. Mereciam mais gente.
A seguir, Filipe Pinto, vencedor dos Ídolos, inaugurou o palco principal nesse dia. Um Fernando Ribeiro meets Manel Cruz, chegou ao palco armado com as suas covers ("Use Somebody", logo a abrir, por exemplo) e mostrou ter, pelo menos, uma coisa: boa voz, no entanto, o resto falha. Provavelmente é apenas vítima da sua inexperiência, apesar de as canções originais não terem impressionado nada. Se conseguirá alguma vez ser algo mais que apenas o tipo que venceu aquela edição do Ídolos? Por agora, não, mas o futuro é incerto e, como disse, boa voz tem de certeza.
De regresso ao outro palco, os Givers estavam-se a safar bem, a conquistar o público com as suas músicas que, por vezes, lembram os Fanfarlo. Com um vocalista francamente caricato e estranho, e com um bom grupo de músicos que tocam em coordenação perfeita, mostraram ser uma boa aposta para aquele palco, que certamente deu algumas boas descobertas aos poucos presentes. Fica-se com pena de não se ver tudo, mas os Interpol estão quase a começar.
Um alinhamento bem pensado, “Slow Hands”, “Take You On a Cruise” e os hinos do passado bem intercalados com os do presente, como “Lights” ou “Barricade”. Uma banda que toca na perfeição, como sempre, e um público pacato mas que tem, surpreendentemente, alguns bons grupos de devotos. Podemo-nos queixar que em palco não são propriamente efusivos ou comunicativos, mas... não são sempre assim?
Aliás, pareciam estar a gostar mais deste concerto que o do Campo Pequeno, por exemplo; o senhor Paul Banks sorriu bastante, e Kessler, como sempre, desliza pelo palco enquanto toca. Quem precisa de incentivos ao público ou interacção, quando há em palco um grupo a tocar assim tão bem? Aquela voz, aliada às excelentes guitarras, envolvem e embalam, e tudo funciona muito bem também graças ao bom som do palco. Um excelente concerto, dado por uma excelente banda, um dos melhores do festival.
O concerto acaba após pouco mais de uma hora, e no outro palco está Zola Jesus. Desta vez veio com uma banda, no São Jorge teve apenas um músico ao sintetizador, mas não faz grande diferença, excepto a bateria, mas também não tem de fazer. Zola corre pelo palco, salta, com um longo vestido branco e transpira presença e carisma. E, claro, a voz, aquela voz, potente e impressionante. As canções novas soam muito bem e aguarda-se agora por um regresso a solo. Termina com “Vessel”, uma canção nova, e é impossível não ficar a desejar por mais.
No outro palco, a começar daqui a nada, estavam os The National. O público não era particularmente numeroso, grande parte dele não estava ali para os ver e isso acabou por afectar o concerto. Isso e um Matt Berninger que mal se mexia atrás do microfone e que por vezes mostrou uma voz mais cansada. Quem os viu pela primeira vez, certamente ficou encantado; quem os viu antes, em Maio, por exemplo, saiu sabendo que eles são capazes de melhor.
Contudo não deixou de ser um belo concerto com um excelente alinhamento. Resgatar “Son”, do primeiro disco, foi um golpe genial, tal como tocar “Available” com o final de “Cardinal Song”. Mas não teve o impacto que se esperava, e canções tão íntimas como “Lucky You” ou “About Today” não resultaram. Foi um grande concerto, contudo para quem já os viu antes, ficou a saber a pouco.
Os Swedish House Mafia, por seu lado, deram mais uma rave em jeito de encerramento do festival. Electrónica que parece saída de uma discoteca, com uma multidão de milhares a vê-los e obviamente fã, foram o último grande concerto do festival e não desiludiram. Alguns remisturas dos Coldplay e dos Red Hot Chili Peppers fizeram os festivaleiros reagir. Por esta altura, a energia já não era muita, mas conseguiram fazer o público saltar e dançar até às tantas da manhã, e isso é, afinal de contas, um triunfo. E, mais uma vez, o Sudoeste terminou como muitos queriam: em festa. Afinal de contas, é para isso que o público lá vai.
Sem grandes falhas tanto a nível de acesso como de recinto, pois este é bem capaz de ser o melhor recinto de todos os festivais, o grande problema do Sudoeste acaba por não vir tanto do festival em si, mas antes de quem o frequenta. Na zona do campismo houve uma sensação de falta de segurança e controlo. A organização reforçou a equipa de segurança, a iluminação e o efectivo policial contudo na última noite houve pessoas que se aproveitaram do facto de o festival estar a terminar para roubar.
Nas próximas edições é necessário apostar mais ainda no aumento do número de policias e seguranças no festival e iluminar as zonas que não tinham luz. É ainda importante que as pessoas que vão para o festival tenham noção do número de pessoas que lá vai estar e de como devem proteger os seus bens e não deixarem coisas à "mão de semear". Ocorreram várias detenções ao longo do festival e isso também demonstra a eficácia da organização.
A facilidade com que se entrava no campismo sem ser revistado, que foi o que me aconteceu, é algo a ser repensado pois facilita a entrada de tudo de bom e de mau… assim e como já foi referido pelo próprio Sudoeste TMN no facebook: “a prevenção vai ter de ser ainda maior”. Tal como acontece pela Europa fora, há muitos festivais que fazem um guia para que o festivaleiro saiba como actuar no caso de diversas situações, seja roubo, violação, agressão ou até venda de droga. Penso que será por aqui que todos os festivais em Portugal tem de apostar e claro na revista de todas as pessoas que vão para o campismo.
O festival terminou em festa com Swedish House Mafia, alguns conseguiram continuar a festa no campismo, outros nem por isso. A edição de 2011 do Festival Sudoeste TMN termina já com uma confirmação para a edição de 2012 - David Guetta, cada vez mais o DJ residente, irá actuar.
O Festival Sudoeste TMN faz a melhor junção entre festival e praia e é cada vez mais um destino obrigatório para muitos festivaleiros. Dois grandes concertos aconteceram e espera-se agora Snoop Dogg e Kayne West num concerto a solo numa qualquer sala do País.
Reportagem Super Bock Super Rock 2011
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No entanto, o recinto em si é a pedra no sapato de toda a gente. A quantidade de pó não deixa de surpreender e o espaço não é suficiente para albergar o número de passes que foram postos à venda este ano. As condições de som também não permitem este número absurdo de pessoas, tendo em conta que mais de metade dos espectadores do palco principal não ouviram quase nada de todos os concertos que ali se passaram. As melhorias não o são, na verdade: o chão em frente ao palco principal é inacreditável. Não há quem não tenha passado a maior parte dos concertos a raspar o chão e afastar troncos de madeira de tamanho considerável de modo a conseguir ter ambos os pés à mesma altura.
Mas as pessoas estão lá pela música. E a música, apesar de tudo o resto, é boa.
Coube aos Sean Riley & The Slowriders as honras de inauguração do palco principal (e de todo o festival). O trânsito não nos deixou chegar a tempo de avaliar a prestação da banda de Leiria, mas soubemos que “It’s Been a Long Night” ficou muito bem representado, apesar das falhas de som que levou a banda a oferecer abraços pelo público.
À nossa chegada - com uma pequena corridinha para chegar a tempo - estavam também os The Glockenwise a entrar em palco. Vindos directamente de Barcelos, têm-se mostrado um pouco por todo o pais. O cheirinho a Milhões de Festa (festival que o vocalista Nuno Rodrigues fez questão de publicitar, sem papas na língua) sentia-se um pouco no ar mal os víssemos a eles e a El Guincho em cartaz. Building Waves ainda tem cartas para dar. Por mais apresentado que esteja um disco, uma coisa que puxa ao mexer de pés como este puxa, não é coisa para se deixar na gaveta (como insistem em deixa o EP de estreia).
O concerto teve início com “It’s Not a Dead End But It Most Certainly Looks Like One”, música que termina o primeiro longa duração do quarteto. “Local Song for Local People” e “Stay Irresponsible” foram as responsáveis por o espaço em frente ao palco se começar a compor, a última foi a responsável pela guitarra do Rafa desistir (como viria a acontecer pelo menos mais três vezes durante o concerto – tudo culpa da correia).
Curiosos e fãs (vindos de Barroselas e de Barcelos) enchiam um recinto que se iria tornando cada vez mais pequeno. Uma banda já de si muito simpática, agradeceu a toda a gente por os ter ido ver, confessando não esperar um público tão grande. Até o mosh teve espaço, em “Columbine (Out of this Town)” ou “Scumbag”. Sem lhes tirar o mérito devido, o público teve certamente um papel fulcral na boa prestação dos barcelenses que pisavam pela primeira vez um festival “grande”.
Pelas 20h20, entram em palco os The Walkmen. Os norte-americanos estavam felizes por regressar e por ter tanta gente a assistir ao espectáculo. «We love it here, we named our álbum after the place!», grita o vocalista Hamilton Leithauser mencionando o álbum Lisbon da banda. A abrir, “On the Water”. O público já estava rendido e os fãs eram muitos. “Woe Is Me” seguiu-se-lhe enquanto mais e mais gente se reunia para ver a banda. Os fãs sabiam as letras e “In the New Year” mostrou isso mesmo.
A banda equilibrou temas antigos e temas recentes. Tocaram uma música nova, composta há semanas, ainda sem nome, que foi bem recebida pelos espectadores. Logo a seguir, a primeira música escrita pela banda – “We’ve Been Had” – bem conhecida de todos. Para o fim, depois da apresentação da banda, ficou “The Rat”, a favorita do público. A letra não falhou a ninguém e as palmas acompanhavam a bateria efervescente de Matt Barrick. A fechar o concerto esteve “All Hands and the Cook”.
Há quem diga que John Lennon voltou, e que lançou um disco na Austrália. Ouvindo Innespeaker, percebemos porquê. Era chegada a vez de “uma das melhores bandas do mundo” (segundo o Nuno dos The Glockenwise). Os Tame Impala chegam-nos directamente da terra dos cangurus com um disco ainda fresco apesar de ter mais de um ano, a estrear o palco EDP de nomes internacionais. Largamente aplaudidos à chegada, entram timidamente com “Why Won’t You Make Up Your Mind?”, com alguns problemas de som.
É que nem todo o palco está pronto para este tipo de psicadelismo, com guitarras a soar a plástico e no entanto tão perfeitamente arranhadas. Durante “Solitude is Bliss”, uma multidão bem feita entoava baixinho as letras do single. “It Is Not Meant to Be” preparava-nos para “Alter Ego”, o momento mais dançável do concerto - para alguns, houve bem quem não parasse durante “Desire Be Desire Go” em versão extended. "É de lamentar que ainda haja público a achar que tem piada apontar lasers aos músicos": Se não teve piada nenhuma durante Iggy Pop no Alive!, durante “Island Walking” teve ainda menos. Os australianos despedem-se com “Half Full Glass of Wine”, esperemos que para voltar em breve.
Dois anos depois, The Kooks estavam de volta a Portugal. Na bagagem vinham temas novos do álbum ainda por lançar Junk of the Heart. Uma multidão sem fim reunia-se pelo recinto do palco principal para ver a banda de Brighton. Temas como “She Moves in Her Own Way”, retirada do primeiro álbum da banda e conhecida de todos, ou “Seaside” mostraram como as letras estavam ainda na memória dos fãs.
Todos os álbuns foram corridos e equilibrados com os temas ainda por vir do último trabalho da banda. “Junk of the Heart” e “Is it Me” (tocada pela primeira vez na rádio inglesa BBC Radio 1 nessa mesma tarde) foram acolhidas pelos espectadores e havia quem já soubesse as letras, inclusive. Dançava-se por toda a parte ao som de “Naive” e “Stormy Weather” e o vocalista Luke Pritchard passeava pelo palco de guitarra às costas notavelmente feliz por estar de volta.
Há alguém que ainda não saiba o que esperar dos espanhóis El Guincho? Já pudemos vê-los pelo menos três vezes a fazer o que fazem melhor, uma tropicália de sons, em ambiente mais que perfeito. A esta hora, já tínhamos os pés cheios de areia, e até soube bem. Os problemas de som mantinham-se no palco EDP e quase que aconselhávamos o Pablo a ir fazer o próprio som. “Kalise” não teve, de todo, a recepção que merecia. Grande parte do público parecia não saber como se mexer ao som da música (que pouco se ouvia, pelo menos algo mais alem do baixo) e ficámos todos a gravitar no espaço durante um bocado, até “Ghetto Facil” e “Soca del Eclipse”, do último Pop Negro.
O espírito Milhões de Festa instalou-se em “Palmitos Park”, sob uma lua cheia que iluminava o espaço – foi o próprio Díaz-Reixa a admiti-lo. Um festival que deixa marcas ao ponto de ser falado duas vezes no mesmo palco, só pode ser boa coisa. “Novias” e “Bombay” já estavam a deixar toda a gente treinada para os paços de dança obrigatórios – a nuvem de pó levantou-se e já não baixou. O adeus nunca feito com “Antillas” gerou o caos no EDP e não deixava vontade de que acabasse, mas ainda havia Lykke Li para encerrar o espaço. Os espanhóis despedem-se, elogiando o país de onde, pelos vistos, gostam de regressar vezes sem conta.
A anteceder os cabeças-de-cartaz, esteve Beirut. Zach Condon e a sua banda regressaram a Portugal para um concerto que encantou os fãs mas não fascinou o público do Meco. Com algumas palavras proferidas em português, o jovem músico apresentou temas dos seus trabalhos Gulag Orkestar e The Flying Club Cup, juntamente com temas já incluídos no seu último trabalho, The Rip Tide, com data de lançamento prevista para 30 de Agosto, como foi o caso de “Vagabond” e “Santa Fe”.
Longe do rock n’ roll, mas com uma variedade de sons e instrumentos admirável, foram temas como “Elephant Gun”, “Postcards from Italy” e “My Night With the Prostitute From Marseille” que fizeram as delícias dos fãs presentes. O som não chegou a todos, havia sítios onde se ouvia melhor a música das bancas da Sic Radical e afins. O músico mostrou a sua alegria em ter voltado e agradeceu a presença e apoio dos fãs, que entoaram as letras sem falhas.
O palco EDP encheu-se de luzes e panos pretos do chão à altura dos holofotes. O cenário estava pronto e o público aguardava a entrada da sueca Lykke Li em palco. Esperava-se um concerto com muita energia, como a cantora nos tem vindo a habituar, mas todos estavam de pé atrás por causa do tom mais calmo que o seu último trabalho, Wounded Rhymes, tinha adquirido.
Para dar início, ouviu-se “Jerome”, do último álbum, um belo tema. De véu preto, que tirava e colocava durante os temas para os dramatizar a seu bel-prazer, Lykke Li empunhava a sua baqueta e dava vida à sua percussão (menos vezes que o que se esperava ver, no entanto). O recinto enchia e acolheu com furor “I’m Good, I’m Gone”. Não foi suficiente, no entanto, já que se ouviu a sueca gritar «you’ve got to give me more than that!» no final do tema.
A sua vontade foi feita e uma multidão eufórica recebeu “Sadness is a Blessing”, um dos singles retirados de Wounded Rhymes. No alinhamento, constaram duas covers: “Silent Shout”, de The Knife e “Until We Bleed”, de Kleerup. “Little Bit”, a habitual favorita, foi recebida com entusiasmo e para o fim ficou a explosão de “Get Some”. Apesar do receio de que este fosse um concerto menos espectacular da sueca, a verdade é que a cantora conseguiu conferir força ao seu último álbum, deixando todos com vontade de um espectáculo em nome próprio por terras lusas.
Em posição de cabeças de cartaz, os ingleses Arctic Monkeys regressam a estas bandas para mostrarem Suck it and See, álbum que deixa algumas reservas em casa, mas que em concerto se traduz nos clássicos macacos. Entraram em palco ainda antes da hora prevista, com “Library Pictures” e um jogo de luzes do qual as outras bandas não gozaram.
E se Suck it and See vinha como assunto principal, houve bastante espaço para temas mais antigos, “Brianstorm” e “This House is a Circus” os primeiros desse grupo a serem entregues a um público devoto que não deixava nada nem ninguém passar-lhes à frente. “Still Take You Home” ainda levou Alex ao chão, esperneando-se com a sua guitarra até voltarmos a assuntos sérios:
“Don’t Sit Down Cause I’ve Moved the Chair” e “Pretty Visitors”, dos dois últimos álbuns. Para os momentos de maior festa e danças por todo o recinto, serviram o clássico “I Bet You Look Good on the Dancefloor” e “When the Sun Goes Down”, antes do encore. A terminar este fantástico concerto, ouviram-se “Suck it and See”, seguida de “Fluorescent Adolescent”, culminando na fantástica “505”. Puro rock n’ roll.
Tivemos poucas oportunidades de passar pelo Palco @Meco, mas o que vimos chegou para perceber que Nicolas Jaar com banda e Tiago Miranda mantinham a tenda no mesmo nível de animação que o restante festival. O fim da noite ficou por conta de James Murphy, dono dos agora defuntos LCD Soundsystem e que levou o maior número de pessoas à tenda, ganhando para muitos o lugar de homem da noite no @Meco.
15 de Julho de 2011
Mais um dia de concertos no festival Super Bock Super Rock, marcado por temperaturas altas e música para todos os públicos, porém, a continuação de más condições. tanto nos acessos como no recinto. O pó e a sobrelotação do acampamento levou a que muitos festivaleiros se sentissem mal no decorrer do evento, no entanto, a vontade de ver as bandas adoradas como Arcade Fire e Portishead é maior do que o desconforto e tenta-se suportar tudo (ou quase tudo). Por volta das quatro horas da tarde, à hora da abertura do recinto, já podiam ser vistas inúmeras pessoas, quer sentadas à sombra das árvores, quer a marcar lugar na grade – pois avistavam-se dois grandes concertos que, certamente, ninguém queria perder.
Foi ao projecto Noiserv, de David Santos, que coube a honra de abrir o palco principal e, apesar de ter tido um público numeroso e ansioso por o ver tocar, não somos capazes de deixar de estranhar este início de alinhamento, uma vez que o cantor e intérprete certamente beneficiaria um palco menor com um ambiente mais intimista.
David Santos não se intimida, no entanto, e, com o seu arsenal de instrumentos e maquinarias, tal como com Diana Mascarenhas, encarregue dos desenhos a preto e branco que iam sendo projectados em metades opostas do palco, encantou um público que o recebeu de braços abertos, a si e aos seus temas acústico-electrónicos suaves. Parecem canções de embalar, mas revelam-se mais profundas que isso: ‘Melody Pops’ e ‘Consolation Prizes’ têm histórias por detrás que são reveladas por uma voz introvertida atrás de uma guitarra. O público encanta-se e o artista sai satisfeito.
Era a altura da actuação dos L.A. no canto oposto do recinto arenoso, um concerto que terá feito a delícia dos muitos espanhóis que se misturavam entre o público, no entanto, a nossa atenção esteve focada em
Rodrigo Leão. Acompanhado pelos Dark Jazz Ensemble, este ofereceu ao público um concerto que terá agradado em maior parte a um público mais adulto, conhecedor quer dos talentos quer do material do artista, mas que não deixou de ser agradável. O multifacetado Leão prima tanto pela construção instrumental elaborada como pela infusão de estilos muito diferentes, mas que nunca chegam a parecer distintos, e é um deleite especial ouvi-lo quando acompanhado pela voz fantástica de Ana Vieira. ‘Vida Tão Estranha’ todos reconhecem, já ‘A Corda’ e o novo tema ‘A Dor Mente’ passa mais ao lado e o concerto culmina em ‘Pasión’ - é com muitos aplausos que se despedem os versáteis músicos.
No palco secundário, é B Fachada que entretém as massas. Uma espécie de ave rara na cena musical portuguesa, é decerto que não agradará a toda a gente, mas transborda de auto-confiança e carisma de tal ponto que os seus concertos acabam por ter graça. Acompanhado por três músicos na sua banda, B Fachada passou por alguns dos temas que já são sua marca, como ‘Estar à Espera ou Procurar’ e mesmo ‘Zé’, muito pedida pelo público.
Este combina a voz teatral em Português às guitarradas acústicas de cantautor, lembrando Sérgio Godinho com um twist moderno, desdobrando-se em personagens nas suas letras quase como Fernando Pessoa. Já não é desconhecido do público português, relembramos que no festival Super Bock em Stock do ano passado também actuou para um São Jorge lotado, e é com toda a naturalidade que se juntaram muitas pessoas para assistir ao miúdo maravilha de língua afiada, mas de talento peculiar a transbordar.
Já o concerto de Paulo Furtado ou Legendary Tigerman, no palco secundário, não tivemos oportunidade de presenciar (são estes os pontos menos bons de um festival centrado em dois palcos), decidindo apanhar os The Gift, no palco principal, juntando-nos aos muitos que já marcavam lugar para lá ficar o resto da noite. No entanto, se todos estavam à espera de um best of da banda portuguesa na hora e pouco em que actuaram, os
The Gift decidiram trocar as voltas ao público e apresentaram, na sua grande parte, temas do novo álbum Explode. Evitam-se os grandes êxitos (menos os inevitáveis, como ‘Driving You Slow’) da grande carreira dos portugueses e entra-se num universo mais agitado, mais entusiasta, com um ligeiro desvio musical, do novo material.
Sónia Tavares e Nuno Gonçalves de tudo tentam para agitar a hoste, incitando-a, correndo pelo palco, no entanto, fica a impressão que os temas de Explode, como ‘RGB’ e ‘Made For You’ não têm o impacto nem a qualidade desejadas. De facto, é com uma certa despreocupação que se assistiu a este concerto, que nem aqueceu, nem arrefeceu.
Mudança mais anti-climática dificilmente houve nesta edição do Super Bock Super Rock, o que nos levou a questionar, novamente, o alinhamento deste segundo dia: chegou a altura dos Portishead tocarem no palco principal, num dos concertos que se afigurou como inesquecível para todos os presentes. Os ingredientes principais desta fórmula (quase) imbatível?
Em primeiro lugar, a estética assombrosa dos efeitos em loop das câmaras que filmavam a banda em palco, que tanto nos transportavam para os anos 80, como nos proporcionavam arrepios na espinha. Em segundo lugar, a voz belíssima de Beth Gibbons, que tem de doce e aterrador em doses iguais, e que é como o estandarte da imensa qualidade musical dos Portishead. É esta voz que nos leva de ‘Silence’, tema que abriu o concerto, para a muito aplaudida ‘Glory Box’ de Dummy (1994), através de um encanto tão grande que parece fantasia.
Por último, é a grande capacidade técnica, não só de execução como de mestria do som, dos restantes membros da banda, que os temas mais mecânicos como ‘Machine Gun’ e ‘The Rip’ são entregues ao público na perfeição. Teme-se o quebrar do feitiço, que à luz da lua parece mais forte do que nunca, no entanto, o público português não hesita em acompanhar Gibbons em temas como ‘Roads’ e ‘Wandering Star’. Foi ‘Over’ o momento alto da noite, num concerto de excelente qualidade, que serviu como um primeiro KO deste segundo dia do festival.
Chega, por fim, o final da noite, e sente-se no ar a ansiedade dos fãs portugueses, que já esperavam pelos Arcade Fire desde Novembro do ano passado. O cenário da banda canadiana envolve a tela de uma sala de cinema e é precisamente assim que começa o concerto, com a exibição de uma sequência de trailers retro e de uma pequena apresentação de Scenes from the Suburbs, o filme de curta metragem da sua autoria, realizado por Spike Jonze. Lançam-se as bases para a completa histeria do público português, exacerbada pela entrada dos músicos em palco e por uma ‘Ready to Start’ que se pronta imediatamente a irromper pela Herdade do Cabeço da Flauta.
Se os Arcade Fire já tinham um certo estatuto de banda de culto entre os portugueses, foi com esta terceira vez em Portugal (já tinham passado precisamente pelo festival Super Bock Super Rock, em 2007) que estes consolidaram uma base de fãs que roça o impressionante. Em ‘Keep the Car Running’ e ‘Neighbourhood #2 (Laika)’, o público não hesita em saltar, esbracejar e cantarolar, tanto as letras, como as próprias melodias, tanto que recebem de Win Butler, porta-voz e líder da banda, o enorme de elogio de lhes lembrarem porque actuam ao vivo. Ora, tamanha devoção a artistas não é rara, mas de uma dimensão tão grande é um ode à qualidade desta banda, que reúne tudo o que uma banda rock moderna deve ser e que se espalha por todos, sem nunca perder o que tem de único: a ligação com quem os ouve.
É, de facto, uma ligação muito especial que estabelecem com os seus fãs, quase espiritual, muito pautada por temas nostálgicos de uma juventude eterna que é bela, e nunca barata. ‘Neighhourhood #1 (Tunnels)’ e ‘The Suburbs’, do homónimo esforço musical lançado ainda este ano, são excelentes exemplos, tal como a universal ‘Crown of Love’ e a adorável ‘Haiti’, interpretada pela mágica e colorida Regine Chassagne, a outra metade da dupla que encabeça esta revolução sonora.
Em palco, estão quase uma dúzia de músicos, que nunca descansam e dão tudo de si, numa despejo de energia incomparável sem nunca se descuidarem tecnicamente. ‘Month of May’ foi um dos momentos que incendiaram por completo o recinto do festival num rodopio frenético sonoro, que quase põe um pézinho no punk, seguida da estrondosa ‘Rebellion (Lies)’, que todos têm na ponta da língua. Este foi, seguramente, um dos momentos da noite e, vindo-se pelo sorriso de orelha a orelha de Win Butler, este não passou despercebido.
Claro que um concerto desta magnitude nunca poderia acabar sem bang e, já no encore, ‘Wake Up’ foi prontamente aplaudida por um público com ânsia de catarse emocional, que atingiu o extremo no tema emblemático dos canadianos. Levantam-se os braços, brada-se aos céus com uma comoção que desassossega e emociona – é este o fenómeno que inunda a Herdade do Cabeço da Flauta e abafa os próprios músicos, é este o abalo delirante que é provocado pelo espírito de um movimento que é maior do que os seus criadores. ‘Sprawl II’ encerra um dos melhores concertos que este festival já viu – para muito agrado de quem tudo suportou para o poder presenciar.
Por fim, uma vez mais, os Arcade Fire provam que já são pesos pesados no panorama musical internacional, mas mais que isso: são uma banda que, além de estilo, têm coração e espírito a transbordar.
16 de Julho de 2011
Foi com concertos como o dos nova-iorquinos The Strokes e Slash que foi encerrada esta 17ª edição do Festival Super Bock Super Rock, na Herdade do Cabeço da Flauta. A segunda edição do festival lisboeta no Meco foi um grande sucesso aparentemente. Apesar de esgotados os bilhetes para a maior parte dos dias o festival conta ainda com algumas deficiências estruturais, tanto a nível do recinto em si, como no acampamento. O pó parece ser uma das maiores queixas, algo a que os organizadores têm de tomar atenção, para não dissuadir os possíveis e futuros festivaleiros que terão reservas em respirar a poeira levantada.
Neste último dia foram os X-Wife, os já muito conhecidos músicos portugueses, que estrearam o palco principal por volta das sete da tarde. Apesar do público ser menor e as condições climatéricas não estarem a favor (tanto em termos de calor como de vento), os portuenses proporcionaram um agradável concerto, repleto de energia e boa-disposição. Junta-se o estilo descontraído dos artistas ao indie rock electrónico e tem-se a receita dos portuenses: temas eficazes como “OntheRadio” e “I Keep On Dancing” conseguiram incitar as massas a abanar as ancas, naquela que foi uma oportunidade de apresentação do novo esforço Infectious Affectional. Considerem-nos convencidos.
Pouco depois, eram os PAUS que faziam furor no palco secundário. A super banda, constituída por nomes como o de Hélio Morais (Linda Martini e If Lucy Fell), Joaquim Albergaria (The Vicious Five) e de Makoto Yagyu (If Lucy Fell), levou os amantes de música por uma viagem tribal e espacial mirabolante ao longo de quase uma hora. Considerado como um dos novos e mais entusiasmantes projectos que se desenrolam em Portugal, os PAUS aliam o inabitual
(tanto na bateria a dobrar como na multiplicidade de influências sonoras) ao empiricamente provado (principalmente os coros) numa comunhão feliz e de inegável qualidade. Ao vivo, mostram uma enorme mestria técnica nos temas do EP É Uma Água – ‘Mudo e Surdo’ é o ponto alto do concerto, sem dúvida - e também nos do disco por lançar em Outubro, que mostram uma vertente ainda mais experimental dos heróis do público português. Um concerto vertiginoso que encheu as medidas.
Novamente no palco principal, era Brandon Flowers que dava ares da sua graça. Sem os The Killers, o músico americano apresentou-se bem disposto e comunicativo na apresentação do seu álbum de estreia, Flamingo, ao público português. Menos chamativo que o trabalho com os restantes membros da banda, os temas do seu álbum de estreia não mostram um grande desvio da sonoridade chave dos The Killers, nem são particularmente originais. No entanto, ‘Jilted Lovers’ e ‘Only The Young’ foram algumas das músicas que mais agitaram os jovens, que os receberam de braços abertos, mas que apenas vibraram nas versões de ‘Mr. Brightside’ e ‘Read My Mind’. Refrões chorudos e pé no electrónico marcam o passo e Brandon Flowers pode, com certeza, ter razões para sorrir com a sua recepção em Portugal a solo.
Já os Junip, no palco secundário, também foram bem recebidos, talvez por um público que ansiava um ambiente mais calmo e uma fuga ao frenesim que caracteriza os festivais de verão. Mais conhecidos pelo seu vocalista, José González, a banda sueca proporcionou um concerto calmo, mas repleto de interesse, naquele que foi o regresso a Portugal desde a actuação no festival Super Bock em Stock, em Dezembro do ano passado.
O receptivo público ouvia com atenção do folk suave, dedilhado em guitarra acústica pelas hábeis mãos de González, claro mestre e maestro dos Junip: mostra-se um tímido e subtil intérprete, mas o sueco sabe quase que hipnotizar os festivaleiros com a sua voz amena, deliciando os ouvidos de quem estava presente. ‘Always’, ‘Rope and Summit’ e ‘Without You’ foram alguns dos temas tocados de Fields(2010), demonstrando uma sonoridade harmoniosa que, não sendo espectacular, é única.
Se os Junip gozaram de um público bastante acolhedor, no palco principal eram os Elbow que se esforçavam por manter os festivaleiros bem despertos. É decerto que os ingleses não criam o rock alternativo mais barulhento, sendo talvez demasiado emotivo e etéreo para reunir um entusiasmo maior do público, mas não se poderá dizer que não têm qualidade.
Vencedores do Mercury Prize pelo álbum SeldomSeen Kid, os Elbow demonstram uma enorme sensibilidade musical na construção de temas belíssimos como ‘LippyKids’, que têm uma complexidade maior do que a que aparentam à primeira vista (daí que cheguem a um rock progressivo, que não o deixa de ser por ser mais moderado). Na apresentação de Build a RocketBoys!, os britânicos mostraram-se excelentes, com uma performance em palco activa e animada, no entanto, a massa de cabeças que já se alojavam perto do palco principal parecia apenas guardar lugar para concertos maiores. É uma pena.
Fomos impossibilitados de assistir ao concerto de Ian Brown, no entanto, permanecemos para testemunhar a presença do mítico Slash, ex-guitarrista dos Guns N’ Roses, no palco português. Rock and roll puro já é de esperar, e foi o que marcou o passo no final do último dia no Meco.
Slash, de cartola na cabeça, continua um inatacável performer ao vivo, deslizando pelo braço da sua guitarra eléctrica como se fosse um próprio membro do seu corpo. A mestria do seu instrumento nunca poderá ser algo que podemos criticar, no entanto, o temas do seu álbum a solo pareciam agradar mais a entusiastas e conhecedores do seu trabalho, permanecendo indiferente para muita gente que assistiam ao artista.
Myles Kennedy emprestou a voz, de forma competente, a temas como ‘Ghost’, ‘Mean Bone’ e ‘Nighttrain’, porém, estes pouco foram capazes de agitar a hoste. O acordar da hipnose (já o cansaço era muito) dos que assistiam só veio com a famosíssima ‘Sweet Child O’ Mine’ e ‘Paradise City’, então sim, entoada pelo recinto e aplaudida como nunca. Velhos êxitos que nunca morrem, por isso pode Slash estar grato.
Messias do indie rock, ídolos de uma geração, chamem-lhe o que quiserem – o fenómeno The Strokes ainda é grande e capaz de atrair um grande público. Os senhores que lançaram uma grande parte do movimento indie, no início do século XXI, apostaram num concerto eficaz, com os melhores momentos da sua carreira, embora tenha pecado por ser curto.
Julian Casablancas e a sua trupe entraram de maneira despreocupada em palco, abrindo de imediato com ‘New York City Cops’, seguindo-se pouco depois por ‘Reptilia’ – e o delírio é universal. Fãs apertam-se, saltam e bradam os versos mais que recordados, tão ansiosos por catarse emocional que é impressionante de ver. Apesar de terem a etiqueta de alternativos, não estão longe do apelidado comercial, com o rock extremamente melódico e harmonioso, repleto de solos, que satisfazem qualquer ouvinte fácil de música.
Sabem que a sua fórmula funciona – basta assistir à sequência ‘Last Nite’, ‘Modern Age’ e ‘Is This It’ para o confirmar, uma vez que, apesar dos ligeiros problemas de som, o público retribui tudo o que lhe é dado, com ânsia de agradar aos seus ídolos. Talvez este culto aos The Strokes tenha sido resultado do pequeno interregno de cinco anos que se seguiu ao lançamento de First Impressions of Earth, em 2006, mas o que é certo é que os fanáticos Strokeanos até o disparo algo ao lado de Angles, lançado neste ano, perdoam. ‘Machu Picchu’ e ‘Under Cover of Darkness’ são belos e agradáveis exemplos deste ligeiro desvio sonoro que deixou a pedir mais, mas que é bem recebido por um público com energia inesgotável.
Ora, se o público brilhou pelo seu apoio incondicional, os performers é que ficaram um pouco a perder. Apesar de comunicativos, o espírito e a quase rebeldia que caracterizava a banda nova-iorquina no início de carreira (e até na passagem por Lisboa, em 2006) parece ter desaparecido, sendo substituído por uma exibição mecânica, embora tecnicamente irrepreensível – Valensi e Hammond, Jr. dedilham as suas guitarras com a mesma pujança de Slash. Já Casablancas passeia pelo palco despreocupado e parece uma sombra de si mesmo – parece estranho quando anteriormente viviam do espírito e da performance ao vivo exuberante e energética.
A lendária ‘Hard to Explain’ antecede a agressiva e energética ‘Juicebox’ e pouco depois é ‘Take It or Leave It’, num fechar explosivo de concerto, mas que não contou com nenhum encore. Os fãs ficam a pedir mais, mas não têm sorte. Fica a memória de uma banda crescida, de um concerto divertido e eficaz, mas também a memória do que já foi.
Reportagem Milhões de Festa 2011
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Bem, parece que é mesmo verdade: o Milhões de Festa é, no mínimo dos mínimos, o festival mais único de todos os festivais. Único não tanto pelos concertos, mas antes pela experiência que proporciona a quem o visita. Se são inegáveis as falhas na organização (que é que raio se passou naquele palco da piscina no último dia?), ainda mais inegável é o enorme valor do festival, que olha para dentro quando outros olham para fora, resgatando nomes nacionais que outros não se lembraram, e apostando em nomes internacionais que afastariam tantos outros.
Querem um festival em que as pessoas em vez de filmarem e tirarem fotos com os telemóveis se calem e ouçam o concerto, e onde até os moches parecem feitos numa espécie de comunhão amigável em que estão todos ali para se divertir em conjunto? Então o Milhões é para vocês.
Os problemas de organização deste ano (e mais vale despachar já isso, para falar depois do que realmente vale a pena) vieram, acima de tudo, da tentativa de fazer demasiado. Veja-se, por exemplo, o palco Lovers & Lollypops, aka, “aquele toldo à beira do rio que estava virado contra o sol e impossibilitava ver de frente os concertos sem apanhar uma insolação”. Som péssimo e um espaço que simplesmente não é, de forma alguma, apropriado para ver concertos. Além, claro, dos problemas em lá chegar. As indicações foram colocadas já perto do fim do primeiro dia, e não foram poucos os que entretanto se perderam a caminho, tentando descobrir aquela descida escondida pela qual eu e mais uns quantos passámos duas ou três vezes sem sequer a ver.
Além disto, houve as mudanças de alinhamento no palco da piscina, reveladas por vezes literalmente em cima da hora. Os atrasos foram, aliás, frequentes ao longo do festival, sendo ainda assim de louvar a forma como foi tratado o assunto: no recinto principal, onde estava o palco Milhões e o palco Vice, os concertos de cada palco só começavam após ter terminado que estava a decorrer no outro. Desta forma, era possível ver todos os concertos, do início ao fim, no recinto. E isto era assim mesmo quando existiam atrasos; uma atitude que, diga-se, nem todos teriam.
Em relação à comida… muitos se queixavam que, no recinto, apenas se podiam comer cachorros (cachorrões, aliás), mas mesmo perto da entrada havia uma banca que vendia hamburgueres, cachorros, bifanas e etc., e, não muito longe, existiam vários restaurantes. Tendo em conta que só no primeiro dia é que vi fila para entrar, era facílimo entrar e sair do recinto a horas de jantar para comer o que quer que fosse. E havia ainda um multibanco literalmente em frente, do outro lado da estrada. Melhor localização era impossível.
E haverá festival mais confortável que este, onde se pode andar calmamente por todo o recinto, que mesmo quando está cheio nunca se torna claustrofóbico? Aliás, o festival nunca esteve demasiado cheio (ficar na grade dum concerto nunca foi tão fácil) - uma maravilha. Para além de tudo, visitar Barcelos vale, por si só, o preço do passe.
22 de Julho de 2011
O início do festival, no palco da piscina, foi com os HILL, e dificilmente poderia ter sido melhor. Dupla com bateria e guitarra… presa à bateria, que toca consoante o reverb que vai recebendo, e que faz rock energético, barulhento e que se ouve sempre bem. A isto se alia um vocalista, João Guedes dos Sizo, com uma baqueta e um tambor, e temos um bom concerto feito. Já disse que a guitarra estava presa à bateria e tocava a partir do reverb? Que ideia genial. O palco da piscina é, aliás, um dos maiores trunfos do festival. Ouvir concertos dentro de água: melhor é impossível.
Os Black Bombaim, que tocaram a seguir em substituição dos cancelados Föllakzoid, mostraram o porquê de serem um dos nomes em clara ascenção no nosso panorama. Rock instrumental stoner onde a guitarra impera, complementada por um excelente baixo e uma excelente bateria. Fica-se com pena que cada banda toque apenas cerca de meia-hora neste palco, com um concerto destes, entregue com energia e sem paragens. Vê-los a solo torna-se imediatamente uma necessidade.
De seguida, vive-se uma aventura para achar o palco da Lovers & Lollypops, onde vão tocar os Botswana. Quando finalmente lá se chega, perto da hora em que o concerto deveria estar a terminar, este ainda nem começou. E quando começa, apercebemo-nos bem do quão mau é o local (não é de admirar que, ao longo de todo o festival, poucos tenham lá ido, salvo em raros concertos). O sol bate de frente, tornando impossível ver confortavelmente o concerto em frente ao palco, e o som está péssimo, levando Joca (provavelmente um dos melhores vocalistas da nossa história) e toda a banda no geral a queixarem-se frequentemente ao longo do espectáculo. Por vezes desaparece a bateria, noutras as guitarras, noutras a voz… E ao que parece, o encarregue pelo som não era sequer técnico (então, Milhões?). Ainda assim, a banda soube dar a volta, dando um bom concerto onde o seu rock emergiu acima de tudo, com o vocalista a cantar perto do público e a banda (que mal cabia naquele palco minúsculo) a tocar na perfeição cada tema. Pediam-se condições melhores, mas não deixou de ser um bom concerto. Como seria de esperar.
O atraso afecta todos os concertos seguintes, e é já com um largo atraso que começa Dirty Beaches. Samples, guitarra, e voz lo-fi são os elementos que compõem, e muito bem, a música de Alex Hungtai, que fez este ano uma pequena digressão pelo nosso país. Eram vários os corajosos que viam o concerto em frente ao palco, levando com o sol em cima, e Alex não tardou a ir com a guitarra para o meio do público. Foi com pena que se saiu do concerto ia este a meio, mas o atraso tramou os planos e começava daqui a nada um dos concertos obrigatórios do dia: Riding Pânico, no palco Vice.
Rock instrumental da pesada, onde as guitarras e a bateria (aqui comandada por Chris Common, dos These Arms Are Snakes) dão descargas de energia do início ao fim. E como poderia não ser assim, com músicas como "E Se a Bela For o Monstro?"? Nunca é demais falar da bateria, tocada de forma impressionante por um Chris Common monstruoso. Uma descarga total de som, em que tudo se conjugava na perfeição. Resta fazer figas para que voltem no próximo Milhões. Ou então apenas para que voltem, ponto.
A festa continuou feita por gente de cá, logo a seguir, quando os Born a Lion subiram ao palco Milhões. Blues com veia muito rock, num concerto que surpreendeu pela sua potência (isto em disco não era assim!) e pela prestação exemplar de todos os músicos sem excepção. Rodrigues, um excelente baterista-vocalista (haverá coisa mais espectacular?), é um animal de palco que vai fazendo a ponte banda-público, falando naquele seu brasileiro tão característico, do Milhões de Festa e do memorável que os próximos dias vão ser. A banda, desaparecida dos palcos há algum tempo, revela ter assinado pela Lovers & Lollypops, e é portanto de esperar um regresso em grande. Por agora fica uma constatação: estão em excelente forma e deram um belíssimo concerto.
No final seguiu-se Motornoise no palco Vice. Metal repetitivo, pouco original, que vale apenas pelo vocalista que se atira para o público e bebe do início ao fim. A subtileza não é um dos fortes da banda (“Esta canção é sobre bêbados, e chama-se… Podres de Bêbados”), e são apenas mais uma banda, igual a tantas outras, que não convence particularmente em nada. Os poucos presentes, no entanto, pareceram convencidos.
Mais convencidos que em AEthenor, talvez a banda mais experimental que passou pelo festival, e que falhou apenas por estar a tocar num ambiente que não era, de forma alguma, o melhor para a sua música. Música ambiente, instrumental, que vive de camadas que se vão desenrolando ao longo de imenso tempo, nunca chegando a um clímax definido. Isto, num festival, de dia, simplesmente não resulta. O público, sentado, não parecia reagir, e percebia-se: é difícil criar o tipo de concentração (ou de ligação, diga-se) necessário para que este tipo de música funcione, num festival, neste ambiente. Alguém que os traga a um sítio pequeno e íntimo, e teremos sem dúvida um belo concerto; aqui, por outro lado, não resultou. É que nem sequer de noite era…
Shit and Shine foi monótono e repetitivo ao início, ainda que fosse interessante ver aquele quarteto em palco, vestidos daquela forma (dois coelhos e um que parecia a rapariga assustadora do The Ring… mas de roupão). Electrónica que parecia não ir a lado nenhum, sem construção nem clímax. Mas, infelizmente, não posso comentar: foi o único concerto de que saí a meio para ir finalmente comer alguma coisa, e parece que depois aquilo deu a volta e ficou muito mais dançável. O que vi, não convenceu, mas acredito que, mais à frente, tenha ficado bem melhor.
Zun Zun Egui, que tocaram no palco Milhões em vez do Vice, como seria previsto, e antes dos Gama Bomb e não depois, deram um concerto agradável, por vezes energético, que só perto do fim começou a cair no aborrecimento. Uma espécie de pop-rock (não gosto do termo, mas há bandas em que assenta bem) com toques de psicadelismo, que em disco soa a lo-fi, mas que ao vivo perde essa dimensão e ganha antes uma veia mais rockeira. O vocalista, uma figura caricata, depois andou pelo recinto durante o resto do festival, frequentemente bêbado, tendo proporcionado, pelo que me contaram, algumas histórias curiosas na piscina. Eu vi lá o Hélio, já foi bom.
Os Gama Bomb foram, basicamente, o concerto mais cliché e divertido do Milhões (e, também, o primeiro a conseguir juntar realmente muita gente em frente ao palco). No bom e no mau sentido. Um vocalista à metal clássico, que lança agudos a torto e a direito (e nós respondiamos com risadas), riffs iguais a tantos outros, e músicos de cabelo comprido com aqueles fatos que são regulares no género. Parecia um concerto de Mastodon, mas… bem, em mau. Mas lá está: daquele mau que chega a ser bom. A verdade é que a própria banda não se parece levar muito a sério, e o vocalista, sempre comunicativo, ajudou (hilariante, o momento em que o público repetiu um grito seu, daqueles agudos, e este respondeu com um “Wow, isso foi uma coisa à Queen. Os Queen estão aqui hoje!”). Divertido, talvez não pelas melhores razões, mas divertido na mesma.
Não há nada de particularmente interessante ou original nos Graveyard, mas fazem canções com uma competência e um bom gosto que ao vivo torna-se difícil não gostar. Os paralelismos com bandas de um rock clássico como, por exemplo, os Led Zeppelin (muita, muita gente com t-shirts deles neste concerto) torna-se inevitável, mas a sua música consegue nunca se tornar nem revivalista nem imitadora. Boa voz, boas guitarras, boas letras. Não há, à partida, nada de particularmente bom, mas ao vivo aguentam-se muitíssimo bem, acabando ainda assim por fartar um pouco os que não são fãs (que, pelo público, nem eram assim tantos). Bom concerto.
De seguida, começou a maior sequência de grandes concertos que se viu em todo o festival, e que fez deste primeiro dia o mais forte dos três: If Lucy Fell, Liars, Veados com Fome e Lobster (o melhor concerto do festival, mas já lá vamos).
Os If Lucy Fell, que não tocavam há dois anos, voltaram e mostraram ser ainda aquilo que sempre foram: poderosos. Podemos falar do grande vocalista, Makoto Yagyu, que a certa altura vai até à mesa do som andando por cima do público, podemos falar do excelente baterista (Hélio Morais, está claro) que cobre cada canção de forma perfeita, podemos falar do bom baixista (Pedro Cobrado) que parece estar a viver a melhor noite da sua vida em palco, tal como o teclista (João Pereira) e podemos, acima de tudo, falar do monumental guitarrista (Rui Carvalho), que é incrível do início ao fim, dando descargas de guitarra que raramente voltariam a ser igualadas em todo o festival. Rock épico, forte e de arrepiar, num concerto que foi, como se esperava, espectacular. Resta agora saber o que farão no futuro.
Os Liars eram, a par das Electrelane, os dois grandes cabeças-de-cartaz do festival. Quem esperava um concerto monumental, dos melhores do ano, talvez tenha ficado desiludido; mas quem esperava um concerto de excelência, com uma energia sem fim por vezes apenas mandada abaixo por alguns momentos mais parados, terá tido mais sorte. Um concerto espectacular, com momentos melhores que outros (nada bateu a "Plaster Casts of Everything", já perto do fim e "Broken Witch", claro, também foi um momento magnífico), mas que esteve bem acima da média e que foi, frequentemente, perto da genialidade. Pura energia, puro rock, puro caos com direito a moche e afins, e um vocalista tão caricato e envolvido no que faz que o concerto teria valido só para o ver em palco. O público, dos maiores que o festival viu, já sabia bem ao que vinha, e pareceu mais que satisfeito no final.
Menos público tiveram os Veados com Fome, que deixaram saudades naquele que foi, ao que tudo indica, o seu último concerto de sempre. Um som poderoso (estava tudo mais alto que o normal, e ainda bem), onde é impressionante o que um trio consegue fazer. Post-rock potente, rápido e ríspido, onde a guitarra grita acima de tudo, sempre com um baterista com tanto talento quanto carisma (Cavalheiro, herói nacional). Canções como "Ultramar" ou "Paquito" (tocadas num mashup) são sempre incríveis, sempre arrepiantes. Um dos concertos mais envolventes do festival, em que a potência do som e das suas canções foi o que mais interessou. Raios, vão fazer tanta falta.
Os Veados com Fome foram uma das duas bandas que marcaram o início da Lovers & Lollypops. A outra banda, e um dos outros grandes regressos da noite, são os Lobster, duo maravilha consituído por Guilherme Canhão (um guitarrista incomparável no nosso panorama, também parte dos Tigrala e dos grandes Sunflare) e Ricardo Martins (baterista igualmente incomparável). Mais vale ser directo e simplista: foi o concerto do festival, e um concerto incrível do início ao fim. Tocaram foram do palco, no chão, no meio do público, e o que se viveu foi não tanto um concerto mas mais uma pura experiência de comunhão como só eles, neste festival, poderiam dar. Foi, diga-se, lindíssimo. Não por ser música bonita, mas por ser música vivida tal como o deve ser e como raramente é. Foram putos a fazer música para outros putos que a querem ouvir com toda a alma e coração, que fazem crowdsurfing e moche mas sempre como se estivessem entre amigos.
Efectivamente, foi isso: dezenas e dezenas de conhecidos, todos ali para o mesmo. Difícil explicar, para quem não esteve lá. E depois houve claro, a música, ainda tão perfeita, tão espontânea mas tão tecnicamente incrível apesar das quedas de som, entregue por dois dos melhores da sua geração (não há volta a dar, são mesmo), que têm entre si uma química espantosa e tocam como mais ninguém o faz. Concerto do festival, dos concertos do ano (e olhem que este ano os Swans, os Arcade Fire e até o Roger Waters já passaram por cá), e uma experiência incrível. A música é isto, e é assim que um concerto deve ser. Uma epifania.
O primeiro dia terminou, assim, da melhor forma possível (ainda houve D.I.S.C.O.Texas Gang depois, parece, mas depois de Lobster o descanso era essencial), e como nunca mais veria a terminar. O primeiro e melhor dia do festival tinha terminado com muito suor, provavelmente algumas lágrimas (raios, aquilo foi uma experiência de amor) e vários sorrisos de orelha a orelha. Foi assim que fomos todos dormir, nessa mesma noite, não só pelo dia que se tinha vivido, mas também por um facto inegável: amanhã havia mais.
23 de Julho de 2011
O primeiro concerto, após mudanças e atrasos na piscina, acaba por ser o dos Indignu, no palco da Lovers & Lollypops (aquele tal que basicamente é um toldo). Rock bem feito, ora instrumental ora com toques de voz, que mostram talento na construção de canções. Uma convidada com violino resultou muitíssimo bem, e no final fica-se apenas com pena da redução que o concerto teve de sofrer, devido aos atrasos existentes.
Volta-se para a piscina e os Long Way to Alaska são os próximos, depois da destruição massiva dos Mr. Miyagi. Não são revelação nenhuma para quem anda atento (estão em clara ascenção), e ao vivo conseguem fazer crescer as já em disco lindíssimas canções de "Eastriver", o belo álbum de estreia. Multi-instrumentalistas natos que vão trocando entre si, tocando músicas que evocam por si só cenários relaxantes que, ali na piscina, ganharam uma força ainda maior. Sugere-se uma digressão feita pelas piscinas do país inteiro. Estes rapazes sabem mesmo o que fazem.
Os Tigrala abriram o palco Milhões e melhor início teria sido difícil. Diversas influências num género musical que se baseia em duas guitarras e na percussão para fazer canções ora energéticas, ora calmas, mas sempre surpreendentes (nunca sabemos bem o que vai suceder a seguir). Um belo concerto, como seria de esperar, tendo em conta os três músicos envolvidos: Guilherme Canhão, Ian Carlos Mendoza e Norberto Lobo. Foi bonito ver o público a chegar a meio e a ficar imediatamente conquistado, sentando-se onde quer que fosse para ouvir o que vinha do palco. Sem falhas.
Kim Ki O foi cancelado (tocou no dia a seguir, na piscina), e por isso o que se seguiu foram os excelentes Causa Sui, banda de rock instrumental que foram, talvez, a grande surpresa de todo o festival. Um público numeroso que não os conhecia mas que ficou rendido do início ao fim, e com razão. Vê-los a tocar (ainda por cima foi no lusco-fusco!) foi uma belíssima surpresa. Um nome a ter em atenção, que com sorte há-de chegar cá a solo em breve. Um dos concertos do dia.
Millionyoung não foi mau, mas não devia estar ali. Devia estar a tocar a fechar o dia, às tantas da manhã, com gente a dançar em frente ao palco. Electro-pop que não se destaca, mas que não aborrece… ou pelo menos não aborreceria, noutro contexto. Ali, não resultou particularmente bem, e isso via-se nem que fosse pelos poucos presentes em frente ao palco. Um concerto que deveria ter acontecido, mas não ali, naquele palco, nem àquelas horas.
Os Kafka afirmavam-se como um dos grandes regressos do festival, mas passaram despercebidos. Os que assistiam ao concerto não pareciam ser fãs, e não foi uma plateia particularmente composta ou efusiva que os recebeu. Post-punk (ecos de Swans, paralelismos com os Mão Morta) que convence, mas não vai muito mais além disso; e um vocalista com presença e energia, mas que não convence nada quando abre a boca. Nunca aborreceu, mas também nunca convenceu por aí além, foi, apenas, mais um concerto. Bons músicos a fazer música que, no entanto, hoje em dia perdeu a originalidade que possuía há anos atrás.
Os Anti-Pop Consortium, que tiveram problemas técnicos antes do concerto e fizeram, a par das Electrolane, o maior soundcheck alguma vez visto em festival, atiraram ao público poesia feita com energia e excelentes beats à mistura. Hip-hop assim, feito tão bem e com palavras tão bem escolhidas, é cada vez mais raro, e foi uma plateia numerosa que recebeu de braços abertos o concerto do início ao fim. Beans, membro do trio, cantou sempre à berma do palco e arriscou até cantar uma canção no fosso, e o grupo parecia estar, de facto, a adorar estar ali em cima. Estilo (muito estilo), e excelente música num concerto exemplar, poesia musical, sem dúvida.
De seguida, uma surpresa: os Best Coast entraram em palco e…. ah… não, espera, eram as Vivian Girls. Bem, pelo que se viu em concerto, vai dar ao mesmo. Não faziam sentido no cartaz em geral e aquele rock cor-de-rosa não convence, acabando antes por aborrecer. Sim, já percebemos todos que malta nova a fazer lo-fi está na moda, mas então que o façam bem, em vez de parecerem uma mera colagem iguais a tantos outros grupos. No dia a seguir, já ninguém se lembrava delas. Mas valeu pelo “A sério? Queres que mostre as mamas? Mostra-nos tu as tuas mamas pouco atractivas!”. Yeah, you go girl.
Os Zu foram a banda que mais barulho fez em todo o festival. Saxofone, bateria, baixo e muito ruído. Se foi mais que apenas ruído? Bem, isso é subjectivo. A mim não convenceu, mas é inegável o mérito e a originalidade do que fazem. O público pareceu convencido, e o concerto, pelo que vejo agora, entrou no top de muitos como um dos melhores concertos do festival. Pessoalmente, não vi coordenação, não vi melodias, não vi música, mas outros (e não foram poucos) viram tudo isso e ainda mais. E isso, afinal, é que interessa. Rock pesado, muito pesado, que não agrada a todos.
Os Secret Chiefs 3 vieram a seguir e deram aquilo que se esperava: um concertaço, facilmente um dos melhores do festival, e o melhor da noite (ao lado do de um certo senhor que actuou a seguir). Um caldeirão de referências, se influências, com canções ora exóticas, ora épicas (a Exodus…), tudo tecido na perfeição por um grupo de excelentes e impressionantes músicos. Tudo assenta na perfeição e, sejamos honestos, valeria tudo nem que fosse para os ver ali a tocar, em robes como se fossem de seitas, a divertirem-se com aquilo que fazem. Foi um concerto curto e concentrado, onde percorreram alguns dos seus melhores temas (nem faltou a cover do tema do Halloween), o que fez com que fosse, basicamente, um concerto consistentemente espectacular do início ao fim - vénias.
E a seguir veio, senhoras e senhores, para um público francamente numeroso, o grande Bob Log III. Um tipo sozinho em palco, com guitarra e uma mini-bateria à frente onde bate com o pé (o Tigerman deve ser fã), vestido como se fosse um membro perdido dos Daft Punk. Rock, blues, tudo ali dado com muito suor, muita alma, muita presença e muito espectáculo. O público não parou quieto, e o senhor Bob também não, com canções rápidas e energéticas umas a seguir às outras. E meu Deus, que guitarrista. Sabia bem como interagir com o público, teve-nos na palma da mão do início ao fim, e deu facilmente um dos concertos do festival. “Senhoras e senhores, deixem-me apresentar-vos a banda” começa ele, perto do fim. “Em todos os instrumentos… EU!”. A one-man-band que foi uma das bandas do festival. Há talentos assim, que bastam por si só. E Bob Log III é um deles. Magnífico.
Foi o último concerto do dia (para mim, leia-se), naquele que foi o pior do festival, e foi o fim perfeito. No dia a seguir, o palco da piscina ia enlouquecer, os atrasos iam voltar, mas os concertos seriam mais e melhores.
24 de Julho de 2011
Último dia do milhões, último dia de festa. O melhor festival (em termos de experiência) chegou ao fim da melhor forma possível, com um último dia onde, esquecendo um palco na piscina onde de repente tudo enlouqueceu e o alinhamento das bandas mudou do nada, tudo correu bem.
Na piscina, tal como já se disse, o alinhamento mudou. As Pega Monstro eram para ser as primeiras, e passaram para muito mais tarde, devido à inclusão dos MKRNI e das Kim Ki O. As Kim Ki O, duas jovens raparigas que fazem electrónica com guitarra e sintetizadores, proporcionaram um belíssimo concerto, agradável e adorável, perfeito para ouvir no relaxamento da piscina ou enquanto se dança um pouco à beira da água.
Os MKRNI (ou Makaroni) são uma banda de electrónica dançável e exótica, tipicamente latina, e complementaram na perfeição a dupla que tocou antes. Foi um belíssimo início e uma óptima ideia, a de ter estas duas bandas a tocarem uma a seguir à outra, e proporcionaram ambas as bandas uma excelente tarde à beira da piscina. Coisas destas só no Milhões. Os Narwhal são também divertidos, mas um pouco mais… aborrecidos. Experimentação a mais e energia a menos para o que se esperava ser mais uma pequena festa aquática. Convenceram, ainda assim.
Os concertos no recinto principal começaram mais cedo neste último dia, e os primeiros a entrar em palco foram os Dear Telephone. Não tão pop quanto se tem dito por aí, fazem música calma, segura mas por vezes repetitiva, que se baseia, acima de tudo, na belíssila voz da vocalista. Um concerto que acabou por ir perdendo interesse ao longo da sua duração. Nem faltou uma cover do clássico "West End Girls", dos Pet Shop Boys, mas nem isso convenceu particularmente, tal como aquela canção nova, sem título, que não encerrou o concero da melhor forma. São competentes, mas esperava-se mais.
Throes e The Shine foram o concerto que se seguiu, e foram uma das coisas mais originais e divertidas que se viu em todo o festival. Rock instrumental meets kuduru (chamava-se rockduru, diziam eles), num espectáculo onde se dançou do início ao fim, vendo-se em frente ao palco um público numeroso e convencido do início ao fim com o que viam.
A combinação resultou surpreendentemente bem, e o rock bem pensado e feito com talento dos Throes (que já mereciam estar num palco assim, grande) resultou na perfeição com o estilo irreverente e espontâneo dos The Shine, que têm de ser da dupla mais divertida na música portuguesa actual. Um novo concerto deles é obrigatório no próximo Milhões.
Dos Papa Topo, não há muito a dizer. “Fofinhos”, como bem dizia uma amiga, e nada mais. E basta, claro. Naquele que deve ter sido um dos concertos mais adoráveis de sempre, esta dupla espanhola deu um concerto para dançar e sorrir, sem pretensões nem qualquer tipo de brilhantismos. Foi divertido, foi agradável, e bastou. O público, infelizmente, não pareceu particularmente conquistado, ficando todo ele sentado durante o concerto, à excepção de algumas espanholas que dançavam em frente ao palco (uma delas de forma profundamente arrepiante) e de uns amigos que depois obriguei a dançar perto do fim (Milhões de Festa é para ter festa, raios!). “Parece música de filmes da Disney”, ouvi dizer, antes da vocalista ter explicado que “A próxima música é sobre fazer sexo no cinema”. Mais ou menos…
Os FM Belfast, por seu lado, deram uma festa autêntica onde ninguém parou quieto. Electrónica azeiteira com imensa gente em palco, e música que são francamente más mas que, ao vivo, resultam francamente bem. A isto se alia uma banda energética, que obriga as pessoas a baixar e a saltar (literalmente, apontaram-me o dedo e obrigaram-me. A sério), e temos um concerto que, quer se goste quer não, é uma festa garantida.
De seguida, uma estreia absoluta: We Trust. O projecto de André Tentugal estreou-se pela primeira vez nos palcos, e o saldo foi positivo, ainda que fosse de esperar mais. A verdade é que Time (Better Not Stop), o single lançado e que não sai da cabeça de sabe-se lá quanta gente, pôs as expectativas bem lá em cima, e estas não foram totalmente cumpridas. Se essa canção é audaz e foge ao normal do electro-pop, as restantes (pelo menos pelo que pareceu, ao vivo) encaixam na perfeição nessa categoria e, mesmo sendo agradáveis e providenciando um bom concerto, não impressionam.
A banda, essa, é notável, com Gil Amado, o baterista/vocalista/guitarrista (já tinha dito que eles eram multi-instrumentalistas, não tinha?) dos Long Way to Alaska, o grande Rui Maia, teclista dos X-Wife, fazendo ainda parte do grupo o baterista dessa mesma banda e um teclista que foi professor do Pedro Abrunhosa. Há ainda arestas por limar, claro, mas no geral vê-se logo o talento envolvido… a falha parece estar, talvez, mesmo mais nas canções. Ainda assim, um bom concerto, e confirma-se: Time é, mesmo ao vivo, uma excelente canção.
De seguida, uma despedida. Os Green Machine, uma das mais notáveis bandas do nosso rock dos bons últimos anos, com um dos mais espectaculares vocalistas da nossa história (o grande, grande Joca aka João Pimenta), deram um dos concertos do festival e um que ficará na memória dos presentes por muito, muito tempo. Rock como só eles fazem, entregue como só eles conseguem, com um público efusivo perante a última oportunidade de ouvir aquelas canções ao vivo. A primeira vez que os vi foi na ZDB, e foi marcante; esta segunda e última voltou a sê-lo.
Não há, simplesmente, mais ninguém como eles. Mostraram estar numa forma exemplar, e foi tudo o que se esperava: crowdsurfing e um público que não parava, músicos em estado de inspiração pura, e uma verdadeira experiência. Foram uma inspiração para muitos (não é do nada que os Glockenwise andavam por lá, a curtir mais que grande parte de todos os outros), e irão deixar muitas, muitas saudades.
Uma despedida seguida de um regresso. As Electrelane eram o maior nome do cartaz, e foi uma sorte tê-las a tocar para nós neste festival, nesta pequena digressão de Verão que andam a fazer. O concerto só confirmou o que já se esperava: fizeram falta. Em modo mais rock e menos pop, percorreram os clássicos da sua discografia num concerto sempre consistente, que em nada foi minado com o facto de terem perdido metade do seu equipamento algures durante o voo e de terem tido de pedir instrumentos emprestados aos músicos do festival.
"Two For The Joy", "Bells" e a fabulosa "Eight Steps" (aquele teclado, aquele piano…) foram alguns dos temas tocados num concerto dado por um quarteto em excelente forma. Aliás, há algo quase de mágico em ver aquelas quatro raparigas em palco, a fazer tão bem o que fazem (grande imagem, aquela da vocalista, de cabelo comprido, a cantar enquanto uma rajada de vento lhe passa pelo corpo). Continuam iguais, continuam a fazer música ora lindíssima ora potente, e deram um dos concertos do festival e, certamente para muitos, um dos concertos do ano. Magnífico.
Washed Out, projecto de Ernest Greene, encheu de seguida o mesmo palco com uma onda de chillwave com toques de synthpop. O seu belo disco, "Within and Without", foi bem recebido por todo o lado (sim, a Pitchfork gostou), e o concerto dado pelo músico e a sua banda (veio com mais gente atrás, felizmente, e até baterista tinha) não impressionou particularmente, mas mostrou potencial e deu a festa que se queria àquela hora da noite. Curiosamente, não pareciam ser muitos os que conheciam o projecto, mesmo tendo em conta o boom que sofreu com este primeiro disco, mas ainda assim o público (não tão numeroso como seria de esperar) não arredou pé do início ao fim. E, claro, coisas como "Eyes Be Closed" resultam muito bem ao vivo.
Os Foot Village são quatro baterias em círculo e gritos pelo meio. Sim, é mesmo a melhor premissa de todos os tempos para uma banda. E se a verdade é que não resultam tão bem quanto poderiam resultar (gritos a mais, baterias a menos), é também inegável que ao vivo é ainda assim algo quase espectacular, duma energia rara e com um grupo de gente que está ali mesmo para se divertir (aquela vocalista era espectacular). Pensem nos Paus, mas com gritos melhores e piores baterias. Acaba por não ser tão bom quanto se esperava (e foi um concerto bastante curto), mas foi bem bom mesmo assim.
De seguida, um dos maiores nomes do festival, e que teve à frente do palco aquela que foi, a par de Electrelane, a maior multidão: Radio Moscow. Rock à antiga, potente, com guitarras a destruir tudo por onde passam e malhas que tornam impossível estar parado. Tocaram quase sem paragens, com pouquíssimas palavras sem ser para apresentar as músicas e agradecer, e conseguiram assim concentrar um belo número de canções em pouco tempo. Tocam na perfeição ao vivo, numa perfeita coordenação entre cada músico, e foi bonito ver aquele público, que conhecia grande parte do alinhamento. Rock assim, clássico mas ao mesmo tempo moderno, é raro, e ao vivo os Radio Moscow (que já são nome regular por cá, felizmente) mostraram conseguir sustentar bem o belo trabalho que fazem em disco.
O meu último concerto do Milhões, quando os membros já doíam, as quatro da manhã não estavam assim tão longe, e a tenda chamava por mim, foi Comanechi aka “a banda punk espectacular daquela rapariga japonesa genial que em palco é um espectáculo”. Final melhor teria sido difícil, num concerto punk à moda antiga, com energia e uma vocalista que parte tudo por onde passa, mostrando estar a adorar estar ali em cima. O público está cansado, mas não o mostra: salta, grita, reage a cada acorde, a cada momento. O público do Milhões é assim (até a própria vocalista se mostrou surpreendida por estar tanta gente ainda no recinto).
Uma grande festa, com crowdsurfing e moche à mistura, daqueles que este festival gosta tanto de oferecer. Muito, muito divertido.
E assim terminou, para mim, o Milhões de Festa. Um ambiente diferente daquele que se vê em qualquer outro festival, concertos como só ali se veriam, e três dias incríveis. Lobster, Green Machine, Electrelane, Veados com Fome, Liars… grandes momentos tornados melhores por serem vistos com um público daqueles, num ambiente inesquecível. Se houveram falhas? Claro que sim. Mas eram inevitáveis. Afinal de contas, o que seríamos nós sem as nossas? Qualquer um as tem, e o Milhões teria de as ter. Este é, afinal, o festival mais humano de Portugal. Um sítio de onde se sai com amizades feitas, ou amizades cimentadas, e com memórias que valem por toda uma vida. Senhoras e senhores, este é o Milhões de Festa.
Não foi, efectivamente, um festival: foram experiências, memórias que vão ficar.
E, para o ano, lá estaremos todos nós novamente. Para vivermos milhões de alegrias.
Reportagem Festival Marés Vivas 2011
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A abrir o Festival Marés Vivas, presentes no palco MocheTMN, "Pitt Broken" e mais os 5 elementos da sua banda aqueceram o público com “Marés Vivas, Will You Be There for a Change?”. No seu estilo pop-rock, a banda apelou à paz e deu as boas-vindas aos festivaleiros com a versão “Bad Romance” e “Perfect Mirror”, que o público recebeu calorosamente.
O concerto seguinte no palco secundário começa com o tema “Lusíadas”, a banda de Coimbra liderada por José Rebola - Anaquim, provou mais uma vez a qualidade da música nacional. O público, com meia lotação, dançou e cantou os temas habituais, como “Na minha Rua” e “Tom Sawyer”. Na música “O Meu Coração”, originalmente em Dueto com Ana Bacalhau dos Deolinda, o vocalista interpretou a voz da cantora, provocando uma onda de aplausos e assobios na plateia. Em interacção constante com o público, a banda toca “As Vidas dos Outros” encerrando em beleza o concerto que já contava com mais de uma hora de duração.
Os brasileiros Natiruts abriram as honras do palco principal ao anoitecer do primeiro dia do festival. A sua música tranquila e cheia de boas vibrações abraçou os fãs que aguardavam ansiosamente pelos êxitos da banda, desde a abertura do recinto.
Misturando os temas clássicos com os mais recentes temas do álbum “Raçaman”, as mensagens de agradecimento à organização não ficaram esquecidas. A banda sublinhou ainda que “a cultura é investimento para o desenvolvimento” em tempos de crise. Relembrando a primeira actuação em Portugal, em 2005, a banda presenteou o público com o tema bem conhecido “Presente de um Beija-Flor”, que todos acompanharam cantando e balançando os braços bem no alto. Este concerto, com sabor a Verão, encerrou com o tema “Liberdade para Dentro da Cabeça”, para rejúbilo do público.
Os senhores do Rock & Roll Português, Xutos & Pontapés, subiram ao palco do festival Marés Vivas com a mesma força e vitalidade que sempre os caracterizou. Marcado pelo regresso de Zé Pedro, afastado dos palcos por motivos de saúde, o concerto contou com os clássicos “À Minha Maneira”, “Não Sou o Único”, “Homem do Leme”, “Maria”, “Chuva Dissolvente”, “Circo de Feras” e “Contentores”.
Entre os temas "Superjacto" e "Perfeito vazio", ambos do último disco, Zé Pedro aproveita para agradecer o apoio dos fãs, confessando que é no palco que se sente bem. Durante mais de uma hora e meia de concerto, pessoas de todas as idades cantaram com a banda os temas já conhecidos, frutos dos 30 anos de carreira da banda. Para terminar em beleza, o esperado tema “Casinha”.
Noite de lua cheia, já passava mais de trinta minutos da uma da manhã, uma multidão aguardava de braços abertos o mais esperado concerto da primeira noite do festival.
Manu Chao invade o palco com a sua energia e estilo contagiantes, camisa azul e chapéu esverdeado, num modo hiperactivo e com fome de palco, presenteou os fãs com os grandes hits da sua carreira durante um concerto que se prolongou até cerca das 4h00 da manhã. Temas como “Welcome to Tijuana”, “Por la Carretera”, “Bongo Bong”, “Clandestino”, “La Vida Tombola”, “Tà di Bobeira” satisfizeram as expectativas dos festivaleiros que acompanharam o concerto com muita cerveja, moche e drogas ilícitas.
Levando o público a saltar e cantar em uníssono, num modo de genuína diversão, foi o tema “Me Gustas Tu” que mais levou ao rubro a assistência. A festa foi constante, introduzindo pelo meio algumas mensagens políticas que assim tanto os caracterizam, Manu Chao vestiu na perfeição o papel de melhor entertainer da primeira grande noite do festival.
Os DJ´s de serviço, João Dinis e Nuno Cordeiro, animaram a noite dos sobreviventes da noite levada ao limite pelos Mano Chao. No palco secundário, ouviram-se temas de jazz, bossa, samba, reggae, ska, funk, drum&bass e afrobeat pela madrugada dentro.
15 de Julho de 2011
A dar início a mais uma noite de festival, durante cerca de 45 minutos, a banda de Mendes e João Só (bem acompanhado pelo público de Gaia), tocou temas como “Deixa-me ver”, “Sexta-Feira Teresa”, “Jimmy Olsen”, “Todas as noites”, “Documentos de amor” e “Vocês Sabem Lá” (numa versão que surpreendeu pela positiva), terminando com o tema “Sofia”. Realça-se a descontracção da banda durante o concerto, em plena harmonia com o ambiente vivido pela assistência.
A banda de Serafim Borges, Sérgio Silva, Pedro Ferreira e Bruno Macedo marcaram presença no palco principal do festival Marés Vivas, no dia 15 de Julho, ainda iluminados pela luz do dia. Os Classificados começaram o concerto com os temas do seu mais recente álbum, lançado no dia 13 de Junho, “Perdidos e Achados”. Relembraram ainda a sua primeira presença no festival, em 2008, ano em que foram nomeados para o prémio de “Melhor Revelação”. Verificou-se uma crescente ocupação do recinto, até se formar uma pequena multidão motivada pelos temas “Ela, Mudar a Minha Sorte” e “Com Medo de Voar”, este último a encerrar a actuação sob uma chuva de aplausos calorosos.
A abrir o palco principal no segundo dia do festival esteve a banda de Leça da Palmeira, Expensive Soul que, em 2011, tem dado cartas nos palcos nacionais. A comprovar este sucesso, é de referir os milhares de pessoas, principalmente camadas mais jovens, que aguardavam impacientemente o início do concerto. Sempre a puxar pelo público, a dupla Demo e New Max, com mais 11 elementos em palco “Jaguar Band” apelou ininterruptamente ao público com frases feitas:
“Como é que é Gaia?”, “Vocês são o melhor público de sempre”, “Vamos arrebentar com tudo isto”, “Quero ouvir essas palmas e os braços no ar”, conseguindo assim animar a malta com os temas “O Amor é Mágico”,”Dou-te Nada”, “13 Mulheres, “Tem Calma Contigo" e "Deixei de Ser Bandido". O tema “Eu não Sei” foi o encerramento de um concerto certeiro, no tempo previsto e sem direito a encore.
Depois da passagem pelo Coliseu da Invicta na digressão motivada pelo novo disco “Wonderlustre”, Skunk Anansie regressam aos palcos portugueses no segundo dia do Festival Marés Vivas. De fato preto justo e brilhante, juntando a um adorno assemelhando-se a umas asas coloridas e cintilantes, Skin abre as honras com o tema “Yes, It’s Fucking Political”, tema do seu novo álbum. Outras músicas do novo trabalho discográfico marcaram presença no concerto, tais como
“Charlie Big Potato”, “Because of You” e “God Loves Only You”. A música “Secretly” despertou a reacção esperada, levando o público a cantar em uníssono. Com a sua energia inesgotável, fez a temperatura subir na audiência com três “crowd surfing”, com perguntas “Are You Fucking Alive?” e mensagens políticas sobre os países que lutam pela sua liberdade cantando o tema “I’ve Had Enough”. Para todos os presentes, um concerto a recordar.
O início do concerto de Moby foi marcado pela entrada da vocalista da banda entoando “In My Heart” (do álbum “18”, remontando a 2002), elevando a expectativa das cerca de 20.000 pessoas que, nessa noite, assistiam ao espectáculo. Logo de seguida Moby invade o palco de guitarra em punho, introduzindo o tema “Go” que, carinhosamente relembra ser a sua primeira obra. Segue-se “Why Does My Heart Feel So Bad?”, tema que o público fez questão de acompanhar numa só voz.
No final de cada música Moby agradece “thank you, thank you, thank you” e em português, “obrigado” sempre mais do que três vezes. É de realçar o papel incansável de Moby em palco que, para além de cantar, deu cartas na guitarra, percussão e teclados. Cruzou temas como “Natural Blues” ou “Porcelain” com as batidas frenéticas de “Disco Lies”, “Lift Me Up”, “Feeling So Real” e “We Are All Made of Stars” (apresentada como a primeira música disco sonbre macânica quântica).
Este concerto fez a ponte entre as várias fases da carreira de Moby, destacando-se um estilo mais raver que nunca. A pergunta “It’s friday night, one in the morning, who wants a disco party?” não desiludiu quem veio para se divertir. No encore, houve direito a uma versão de "Whole Lotta Love", no início mais bluesy e no final num estilo à Led Zeppelin. O concerto encerra "Feeling So Real", um verdadeiro hino rave.
16 de Julho de 2011
Durante os 30 minutos de actuação, a luso-descendente Mia Rose presenteou o público com o seu charme natural e interpretou versões de temas de Rui Veloso, Maroon 5 e Cee Lo Green. Agradeceu a presença naquele que considera o “maior festival do Norte do País” e proporcionou um concerto relaxado, bem ao estilo do ambiente Marés Vivas.
Os Azeitonas, como seu estilo rock cheio e energia, subiram ao palco moche para protagonizarem um concerto que, apesar de semelhante a actuações anteriores, não deixou de satisfazer a pequena multidão que ocupou o recinto do palco secundário do festival Marés Vivas. Com a “casa cheia”, animaram o público com canções como “Quem és tu Miúda”, “ e “Anda Comigo ver os Aviões”.
Num palco decorado com vários candeeiros e uma carpete vermelha, a portuguesa Áurea e mais oito elementos da sua banda entraram no palco, primando pela pontualidade. Às 20h30 já um público vasto esperava a actuação da artista que, como tema de abertura "The Main Things About Me", seguido de "Waiting, Waiting (For Me)", foi trazendo cada vez mais pessoas para o recinto. Nas paragens entre as músicas a cantora, vestindo uma saia travada preta e top tigresa, e os pés descalços, não se esqueceu de agradecer ao público e à organização do festival.
Os membros da banda vestiam fato preto, gravata e camisa branca. Uma nota para as coreografias discretas do saxofonista e trompetista, com as mãos, acompanhadas habilidosamente por alguns membros do público. O quarto tema, o primeiro single da banda “Busy (For Me)”, encheu as medidas do público. Logo de seguida a cantora anunciou duas surpresas. A primeira revelou-se uma versão, primeiro sensual e depois em alta rotação da música “Kiss” de Prince.
A segunda surpresa foi uma versão de "Don't Ya Say It", de Bryan Adams. O tema "No No No No, (I Don't To Fall In Love With You Baby)" foi amplamente aplaudido e permitiu muita interacção com o público. O final foi feito com a repetição de "Busy (For Me)" , já com o palco completamente molhado.
A banda Tindersticks subiu ao palco principal protagonizando um concerto intimista, com pouca luz em palco e os ecrãs LED’s desligados. Apesar de se ter verificado que algumas pessoas saíram do recinto em busca de abrigo para a chuva, nem o estado meteorológico demoveu grande parte do público resistente do Marés Vivas.
O concerto foi uma verdadeira viagem pelos anos 90 e, apesar da notória desilusão demonstrada pelo Stuart Staples face ao clima que esperava em Portugal (até trouxe um fato de linho branco condizente com o bom tempo tão desejado), a banda cumpriu a sua missão e, sem grandes palavras para com o público, despediu-se de Portugal ao fim de menos de uma hora de concerto.
Para assistir ao concerto da banda irlandesa de rock alternativo, os The Cranberries, estiveram presentes mais de 20.000 pessoas, debaixo de uma chuva persistente. Apesar da paragem da banda entre o ano de 2003 e 2009, a voz inconfundível da vocalista Dolores O’Riordan não perdeu qualidade e presenteou os fãs com os temas "Linger", "Ode to My Family","Just My Imagination", "Salvation" (tema interpretado com penas de índio) e "Zombie" cuja letra foi maioritariamente cantada pelo público. No encore, repetiram-se os temas "Promises" e "Dreams" levando o concerto a terminar num ponto alto, para consolo dos fãs.
O artista Mika, que passou por Portugal na edição 2010 do festival Sudoeste TMN e, em Outubro passado pelas festas académicas de Coimbra, encerrou o palco principal no último dia do Festival Marés Vivas no 16 de Julho. Numa noite marcada pela chuva miudinha até à 3ª música do concerto,
Mika conseguiu motivar cerca de 22 mil pessoas a ficar até ao final do espectáculo que durou cerca de 1h30, debaixo de uma “brisa” cortante. Num palco decorado com falsos quadros antigos, um candelabro de cristal e com a banda vestida a rigor, a banda recebeu no seu “palácio” o calor de um público recheado de fãs incondicionais.
A dar entrada, soou o esperado tema “Relax, Take it Easy”, levando ao rubro a assistência. Sem deixar esmorecer os ânimos, seguiu-se a música “Big Girl (You Are Beautiful)” e “Stuck in the Middle”. Na quarta música Mika sobre para cima do piano, mostrando mais uma vez que com “pouco” faz muito espectáculo. Aproveita para elogiar a multidão e falar pequenas frases em Português, conquistando ainda mais a simpatia do público.
Dividiu o público em duas partes e propôs uma canção ao despique, para introduzir o próximo tema “Blame It On the Girls”. A noite ficou marcada pelos sucessivos êxitos das tabelas de vendas, tais como “We are Golden”, “Rain” (coincidente com o clima da noite), “Grace Kelly” e “Love Me”, “Lollipop” e uma música entoada em língua francesa. Uma noite a recordar.