Gum Takes Tooth + Superalma Project
Regresso dos britânicos Gum Takes Tooth a Portugal para três atuações , incluindo uma passagem pela cave da Socorro numa matiné de sexta- feira particularmente intimista que contou ainda com a presença de Superalma Project.
E é precisamente por aí que iniciamos esta reportagem, pois o que aqui vimos foi uma autêntica pérola. Alter ego de Igor Almeida, músico brasileiro radicado em Portugal, assinou uma prestação altamente poderosa de eletrónica experimental , ali entre o ambient e o glitch (pense-se em Arca no seu formato mais atmosférico , ou em Oneohtrix Point Never), numa sonoridade que tanto soava etérea como intensamente insólita e que parecia viver num estado perpétuo de mutação frenética, como uma escultura psicadélica de emoções à flor da pele. O uso de um suporte visual ajudou a transformar a performance numa das experiências sensoriais mais imersivas que já testemunhamos na Socorro, sublime “ trip” de uma transcendência arrebatadora que parecia rasgar a pele para penetrar na alma - o sentimento de catarse, acreditem, era real e fortíssimo.
No final, já depois de uma última imagem onde se lia “Free Palestine”, pudemos respirar fundo após experienciarmos esta estrondosa descarga de surrealismo audiovisual. Mais disto nas nossas vidas (e na Socorro também), pois foi monumental.
Seguiram-se os Gum Takes Tooth, aqui a promover o seu quarto álbum , intitulado “ Recovery Position”, e agora totalmente abraçados, em palco, a um formato claramente eletrónico, já sem bateria e servindo-se somente de vozes e maquinaria. E verdade seja dita, se essa mudança é obviamente válida, com ela perdeu-se um pouco da pujança de outrora , aquele “ataque” caoticamente insólito de natureza punk experimental que apresentaram, por exemplo, no Milhões de Festa em 2015. Agora permanece o sentimento de estranheza ao mesmo tempo intrigante e sedutor, com o vocalista Jussi Brightmore a adotar um registo performativo em determinados momentos, mas a fórmula é visivelmente diferente , assemelhando-se muito mais a um techno denso e de sabor industrial a emanar de um qualquer armazém abandonado . Aliás, foi mesmo nesse tom de minimalismo eletrónico possante que terminaram a atuação ,com o público a abanar a cabeça e o corpo enquanto levava com batidas hipnóticas.
Efetivamente a evolução do duo não é de todo negativa, pois para além de ainda lançar discos bastante recomendáveis ( e “Recovery Position” não é exceção, peguem lá nele ), continua capaz de criar um ambiente contagiante ao vivo- a própria receção positiva do público, pouco mas bom , é prova disso mesmo - , mas estaríamos a mentir se disséssemos que não sentimos algumas saudades daquilo que os Gum Takes Tooth começaram por ser. Seja como for, quando tudo terminou, o saldo foi seguramente positivo. Encaremos então esta passagem como uma rave de final de tarde muitíssimo agradável, inebriante e algo dissonante por parte de uma banda que parece desejar a constante reinvenção.
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segunda-feira, 09 setembro 2024